
Resenha de ShowTítulo: Nossa Língua, Nossa Música
Artistas: Fabiana Cozza e Eneida Marta
Local: Teatro II do Centro Cultural Banco do Brasil (RJ)
Data: 21 de julho de 2009 (sessão das 12h30m)
Cotação: * * * * 1/2
Uma, Fabiana Cozza, é paulistana, só que descende de angolanos e canta samba com forte sotaque afro. A outra, Eneida Marta, vem de Guiné Bissau, país africano cujos ritmos ela propaga com uma voz e uma ginga que já conquistaram Cabo Verde e Portugal. Juntas, unidas por esse elo afro e por sintonia musical que se insinuou forte verdadeira no palco, Cozza e Eneida abriram nesta terça-feira, 21 de julho de 2009, o projeto Nossa Língua, Nossa Música - apresentado pelo Centro Cultural Banco do Brasil com curadoria de Jocelyne Aymon, suíça que teve a idéia de agregar nesse ciclo artistas oriundos de países lusófonos, no ano em que acordo ortográfico sentenciou a unificação da Língua Portuguesa.
Nem foi preciso o gracioso dueto feito ao fim do show para ressaltar a irmandade musical que liga Cozza a Eneida. Ambas têm vozes calorosas, parecem cantar com todo o corpo e lançam mão da dança para reforçar seus números. E ambas abriram seus sets com temas cantados a capella. Com grande domínio de palco, Cozza mergulhou com expressividade no samba Embarcação (Francis Hime e Chico Buarque), brincou com o ritmo de Coisa Feita (João Bosco, Paulo Emílio e Aldir Blanc) - num diálogo de sua voz com o pandeiro esperto tocado pelo percussionista Douglas Alonso - e apresentou música inédita em sua voz, Santa Bamba (Kiko Dinucci e Fabiano Ramos Torres), de acento afro já recorrente em sua discografia. "Ainda não gravei, mas irei gravar", anunciou Cozza, cujo show teve roteiro baseado no repertório de seu segundo álbum, Quando o Céu Clarear (2007). Deste disco, marcaram bela presença a faixa-título (de Roque Ferreira), Tendência (Ivone Lara e Jorge Aragão - em número que destacou o virtuoso violão sete cordas de Rogério Caetano) e Agradecer e Abraçar, tema de Gerônimo e Vevé Calazans que foi o ponto alto da apresentação de Cozza pela total sintonia entre música e dança.
Ao fim de Santa Bamba, Cozza chamou Eneida Marta para ocupar o palco do Teatro II do CCBB carioca. Ao apresentar seu mix de ritmos africanos através de temas como Mindjer Dôce Mel (Mimito) e N'Pirdi Coragem (tema tradicional da África, de tom mais emotivo), Eneida se mostrou carismática e dona de voz ao mesmo tempo forte e doce. O violonista Rogério Caetano e o percussionista Douglas Alonso permaneceram no palco, mas quem roubou a cena entre os instrumentistas foi o pianista Juca Delgado. O toque leve do piano de Delgado é puro suingue. E ele ainda respondeu pelos vocais de números como N'Mistiu (Toizinho Delgado). Mas em Guiné na Mundo Fora apareceu também toda a força da percussão de Alonso - uma proeza, visto que ele e Rogério não conheciam o repertório da cantora da Guiné Bissau, cuja apresentação foi calcada no repertório de seu terceiro álbum, Lôpe Kaï (2006). Como Cozza, Eneida também faz bom uso da dança em cena. Seus rodopios pelo palco ao ritmo frenético de Tambur embelezaram esse número. Cantando descalça, Eneida se mostrou comunicativa e, ao fim do show, pôs a platéia para cantar no ritmo criollo de Tio Bernal (José Carlos Schwarz). Enfim, falando a língua da fraternidade universal, Fabiana Cozza e Eneida Marta deram um show de voz e presença em um encontro sedutor que reforçou a (oni)presença da mãe África na música do mundo.