Resenha de livroTítulo: Vale Tudo - O Som e a Fúria de Tim MaiaAutor: Nelson MottaEditora: Objetiva (392 páginas, R$ 49,90)Cotação: * * * * 1/2Tim Maia (1942 - 1998) adorava criar caso. Por seu temperamento louco e explosivo, foi personagem principal de vários
causos. Casos e
causos do
Síndico são o motor da narrativa da gorda biografia
Vale Tudo - O Som e a Fúria de Tim Maia, escrita por Nelson Motta, o jornalista e produtor musical que teve seu caminho cruzado com o de Tim já em 1969, quando arquitetou o dueto do cantor com Elis Regina (1945 - 1982) em
These Are the Songs. Motta é dono de um texto saboroso. E é com leveza que ele conta a vida e obra do
peso-pesado do soul brasileiro. O livro não altera a visão recorrente que se tem de Tim Maia - artista
doidão, genial e genioso, que conseguiu traduzir a música negra americana para o idioma nacional - só que é interessante da primeira à última de suas 392 páginas. Como já ratificara em seu ótimo livro
Noites Tropicais, Motta tem o dom da palavra escrita e sabe contar uma história. E histórias, deliciosas, são tudo o que
Tim Maia do Brasil protagonizou ao longo de sua turbulenta existência de excessos.
Diferentemente de
Noites Tropicais, um livro de tom bem mais descompromissado, há em
Vale Tudo maior rigor com datas e informações, já que se trata de biografia. Um ou outro equívoco - como afirmar na página 70 que Roberto Carlos vendia um milhão de discos nos anos 60 (o
Rei somente atingiria esta marca com seu álbum de 1977) - em nada tira a credibilidade da narrativa escrita em ordem cronológica. Nelson Motta nunca faz pouco caso de Tim Maia. Relata sem meias palavras as peripécias do cantor com leis, álcool, drogas e mulheres sem nunca pôr em segundo plano a obra musical do artista. Cada disco é analisado com (aguçado) espírito crítico. Se não há o menor moralismo na exposição de excessos do biografado, há a vigilância do biógrafo em relação à abordagem da música de um artista que, afinal, foi seu amigo. Justo, Motta nunca esbarra na complacência. Daí o grande valor desta biografia que, mesmo sem alterar o perfil de Tim Maia construído no imaginário popular, refaz os passos de um artista absolutamente original que nunca perdeu de vista sua pegada inicial, mesmo quando aderiu à modismos como a
disco music - em álbum de 1978 que lhe rendeu clássicos como
Acenda o Farol - ou quando sucumbiu ao excesso de açúcar da música brega (a partir dos anos 80). Mesmo calcada no funk e no soul norte-americano, a música de Tim Maia foi tão grande que nunca coube num rótulo. Tim já foi um rótulo em si...
Casos e 'causos' de Tim Maia* Briga com Roberto CarlosEntão colegas no conjunto The Sputniks, formado por Tim Maia em 1957, ele e Roberto Carlos quase saíram no tapa na porta do estúdios da TV Tupi. Depois da primeira e única apresentação do grupo na televisão, Tim partiu para cima de Roberto ao saber que este convencera Carlos Imperial a deixá-lo se apresentar sozinho.
* Solidão nos Estados UnidosEntre 1959 e 1964, Tim tentou
fazer a América. Nos EUA, travou contato com o soul. Mas tudo o que conseguiu foi uma temporada na cadeia por furto e subempregos. Em 28 de setembro de 1961, Tim trabalhava como
baby-sitter quando se deu conta, pela TV, da data. Era seu aniversário. Ele fazia 19 anos, triste e deprimido.
* O fracasso do primeiro discoPor recomendação de Roberto Carlos, Tim conseguiu no início de 1968 a chance de gravar o seu primeiro disco na CBS. Contudo, o compacto - com a balada
Sentimentos e o samba-soul
Meu País - passaria despercebido. O sucesso viria somente em 1969, com a gravação de
Não Vou Ficar por Roberto Carlos, o dueto com Elis Regina em
These Are the Songs e o compacto de
Primavera, que abriu caminho para a gravação do (genial) primeiro LP em 1970.
* O encanto pelo UniversoEm julho de 1974, rompido com a Polydor, Tim preparava álbum duplo para a RCA quando, em visitar a Tibério Gaspar no Recreio dos Bandeirantes (RJ), folheou um livro sobre a seita Universo em Desencanto, que pregava a existência de um planeta superior, o Racional. Mistificado pela leitura, Tim rompeu com a gravadora RCA e lançou o álbum duplo de forma independente, em benefício da seita, com a qual se desiludiria somente em setembro de 1975.
* 'Nuvens' foi para o espaçoEm 1981, brigado com todas as gravadoras, Tim se viu obrigado a partir para a produção independente. Gravou o LP
Nuvens por sua própria companhia, a Seroma, mas o álbum foi para o espaço por conta da distribuição caseira. O fiasco deixou Tim desiludido.
* O 'vestido' que não ficou prontoTim Maia aceitou gravar um clipe com Gal Costa para o programa
Fantástico por conta do dueto feito com a cantora na balada
Um Dia de Domingo. No dia da gravação, a RCA avisou o cantor que a filmagem seria adiada para dali a dois dias porque o vestido de Gal não ficara pronto. Dois dias depois, quando a gravadora ligou para Tim para avisar que o carro ia buscá-lo para a gravação, ele disse que não iria e mandou um recado sucinto para Gal: "o meu vestido não ficou pronto". Não houve clipe. Mas a balada liderou a parada.