Resenha de Show Título: Peça MPB - Marina Lima em Revista
Artista: Marina Lima (em fotos de Mauro Ferreira)
Local: Teatro dos Quatro (RJ)
Data: 31 de maio de 2010
Cotação: * * * 1/2
"Este não é um show novo... Ainda não é o Clímax... É um show a caminho de...", conceituou Marina Lima, logo após apresentar a inédita Doce de Nós para o público antenado que encheu o Teatro dos Quatro, no Rio de Janeiro (RJ), na noite de 31 de maio de 2010. Havia um clima de expectativa no ar. Era, afinal, a volta de Marina aos palcos cariocas - após ausência de um ano - e era também a primeira vez que seus fãs cariocas iriam conhecer ao vivo o repertório inédito que a artista já alinhava para formatar o roteiro do show Clímax, ainda sem data certa para subir à cena (cogita-se que seria em São Paulo no segundo semestre, mas, por ora, nada há de concreto). De quebra, o público ouviu Marina refazer antigas incursões pelos repertórios de Lobão (Me Chama, perfeitamente ajustada ao tom quente do show), Zélia Duncan (Tempestade, belo momento do roteiro) e Erasmo Carlos (Mesmo que Seja Eu, com pausas inusitadas que revalorizaram o número).
A expectativa foi cumprida. A caminho do Clímax, aos 54 anos, Marina expressa dores, inquietudes e urgências típicas do que se pode chamar maturidade. "Me deixe quieta com a minha solidão / A vida é minha e também meu coração / E, se você já encontrou sua parte, / Me Deixe em paz / Atrás da parte que me cabe", suplica em versos de A Parte que me Cabe, pseudo-samba em que confronta sentimentos e atitudes da juventude com as aspirações da tal maturidade. Marina já parece saber que nada será como antes. E não é. Mesmo os velhos sucessos - como Charme do Mundo (1981) e O Chamado (1993) - soaram novos, repaginados para os tempos modernos pelas programações eletrônicas urdidas pelo baixista e guitarrista Edu Martins. A voz, que ameaçou não sair no primeiro frio número, Fullgás (1984), acabou vindo para ajudar Marina a expressar toda a atitude que há em inéditas como Não me Venha Mais com Amor - primeira parceria com Adriana Calcanhoto, já em rotação em rádios de São Paulo (SP) - e também na abordagem cool de Call me, o tema gravado por Chris Montez em 1965, reminiscência da "pré-adolescência" de Marina, como ela contou no show. Ao desconstruir o ritmo da música, a cantora evidencia a pungência escondida na letra escrita por Tony Hatch na forma de recado para o ser amado em (imaginado) sofrimento.
Recado é também o que Marina manda através dos versos de Lex, inédita envolta em arranjo que evoca o som cheio de camadas do grupo inglês Radiohead. "Teus olhos cansados evocam os fados para eu não mais partir", relata Marina, expondo dor de amor vivido em Lisboa. Em Lex, ficam evidentes a firmeza e a atitude da artista. A energia posta na interpretação valoriza música que, numa primeira impressão, não reedita a inspiração melódica de tempos áureos - evocada no recente tango Três (2006). Doce de Nós deixa a mesma sensação. Mas fica boa impressão de Keep Walking, balada embebida em clima roqueiro. E, em português ou em inglês, as letras continuam invariavelmente interessantes. Até porque, em cena, com sua guitarra encorpando o som produzido pelo trio esperto, Marina Lima ainda parece ter todo o charme do mundo. Nesse show de transição, pontuado por interrupções e reclamações sobre o som, fica claro que a artista está em sintonia com os dias de hoje, driblando as limitações vocais com bravura - atestada pelo sons guturais emitidos em O Chamado - e expondo as urgências existenciais de quem tem o charme - mas já não todo o tempo... - do mundo. Marina vai chegar ao Clímax com atitude!