Continuação foca Lenine com jeito de making of
Título: Continuação
Direção: Rodrigo Pinto
Roteiro: Daniel Garcia
e Rodrigo Pinto
Cotação: * *
Em cartaz no Festival
do Rio 2009
(Sessões entre 2 e 7 de
outubro de 2009)
Continuação - o filme do jornalista e cineasta Rodrigo Pinto sobre Lenine, ora em exibição dentro da Première Brasil Música do Festival do Rio 2009 - foca o artista durante o processo de gravação do álbum Labiata (2008). As imagens captadas ao longo de nove meses entre Rio de Janeiro (RJ), Araras (RJ), Recife (PE) e Wiltshire (Inglaterra) poderiam fornecer a pista para o entendimento do processo de criação de Lenine, dono de obra que vem ganhando peso mais pela maneira cosmopolita como é formatada. Porém, Continuação expõe não mais do que lampejos desse processo. A rigor, o que se vê e ouve na tela ao longo de 71 minutos poderia render alentado making of para um DVD do cantor. Pinto foge do documentário biográfico e tampouco cede à tentação de empilhar depoimentos para traçar um perfil generoso do artista. Em contrapartida, toda a discussão que o filme propõe - a dicotomia entre o passado e o futuro da música no momento em que o mercado fonográfico se dilui e sofre reviravoltas com a revolução digital - patina em nível superficial. Lenine defende interessantes pontos de vista, salpicados entre uma tomada e outra. Um deles é a crença de que o conceito de álbum não se sustenta quando o ouvinte baixa um amontoado de músicas na internet e as ouve em sequência aleatória. Há também uma conversa saudosista do compositor com o parceiro Arnaldo Antunes sobre as sensações táteis do vinil. Contudo, estes bons fragmentos de ideias não formam um todo consistente a ponto de abrir um debate ou de provocar reflexões. A direção de Pinto é correta, mas o roteiro - assinado pelo cineasta estreante em parceria com Daniel Garcia - se revela sem rumo e não sustenta a originalidade do conceito. Entre cenas de estúdios e camarins, os instantes mais reveladores estão na visita de Lenine aos pais, em Recife (PE). Não tanto pelo que é dito (embora seja pungente a cena em que seu pai admita que, aos 80 anos, chora à toa para liberar as emoções que foram reprimidas ao longo da vida), mas pelos silêncios. A pausa é elemento determinante na formatação de uma música, ensina Lenine em outra cena. É em Recife também que Lenine revela a influência determinante que discos de Dorival Caymmi (1914 - 2008) e Ary Lobo (1930 - 1980) tiveram em sua formação musical. Mesmo assim, na ausência de informações mais detalhadas sobre a trajetória ímpar do artista, Continuação acaba ficando com jeito de making of. Eventualmente até bem-humorado, como na cena em que João Cavalcanti, filho do cantor, revela maroto no estúdio que Lenine às vezes é confundido com Humberto Gessinger, o mentor da banda gaúcha Engenheiros do Hawaii. Só que, entre o humor bissexto e as reflexões sobre o futuro da música, o documentário não alça um alto voo filosófico.