Resenha de showTítulo: A Nova Geração Canta João DonatoArtista: Adriana Calcanhotto, Bebel Gilberto, Fernanda Takai, João Donato, Marcelo Camelo, Marcelo D2 e Roberta Sá (em foto de Greg Salibian)
Local: Theatro Municipal do Rio de Janeiro (RJ)Data: 11 de julho de 2008Cotação: * * 1/2"João Donato sempre foi moderno", saudou Nelson Motta ao apresentar o show da série ItaúBrasil que saúda o compositor de A Rã dentro do ciclo de espetáculos que celebram os 50 anos da Bossa Nova. Diretor e roteirista de A Nova Geração Canta João Donato, Motta se esqueceu ao escalar o elenco de que ser moderno é diferente de ter aura hype. Resultado: o público que lotou o Theatro Municipal do Rio de Janeiro, na noite de 11 de julho de 2008, para reverenciar o mestre Donato e sua obra magistral, se viu obrigado a testemunhar momentos a rigor constrangedores entre alguns números bacanas. A terceira e última apresentação do tributo teve caráter oscilante. E não foi por conta de alguns problemas de som. Fora de seu universo musical, Bebel Gilberto e Marcelo Camelo mostraram talento limitado. Em contrapartida, Adriana Calcanhotto, Fernanda Takai, Marcelo D2 e Roberta Sá tiveram bons momentos. E a presença de Donato, nos últimos cinco números, salvou a festa. E, apesar do brilhantismo dos arranjos criados por Mario Adnet e executados pela feríssima Orquestra Ouro Negro (com alguns dos melhores músicos do Brasil), o suingue típico e personalíssimo da obra de Donato somente apareceu em cena quando o próprio assumiu o piano já no bloco final, em que reinou o improviso entre o elenco.
Bebel Gilberto abriu a noite. Muito apropriadamente, a filha de João Gilberto citou no figurino e na postura a Gal Costa dos anos 70, intérprete das três músicas (A Rã, Flor de Maracujá e Até Quem Sabe) soladas por Bebel. Músicas emblemáticas gravadas por Gal em um de seus melhores álbuns, Cantar (1974), arranjado por Donato. Em A Rã e Flor de Maracujá, Bebel ainda foi razoavelmente bem no embalo do suingue dos temas, mas na canção Até Quem Sabe - em arranjo que destacou sua voz opaca e o piano de Marcos Nimrichter - ficou evidente o despreparo vocal da ruim cantora, que desafinou e diluiu a beleza da balada. Deu saudades de Gal. Em seguida, Bebel chamou Adriana Calcanhotto, anunciada como "a melhor intérprete de minhas canções". Juntas, as duas fizeram dueto em Bananeira que soou mais charmoso pelas coreografias do que pela interpretação em si, sendo que no começo Calcanhotto foi prejudicada por problemas no microfone.
Sozinha em cena, Calcanhotto apresentou Amazonas - com nova letra criada por Arnaldo Antunes e Péricles Cavalcanti, intitulada Amazonas II - e, na seqüência, fez o número mais pungente da noite, Naquela Estação, transformada na primeira parte numa toada caipira. Sintomaticamente, ao fim do número, soaram os primeiros aplausos (genuinamente) entusiasmados. Em seguida, Calcanhotto reviveu Emoriô sem ser a intérprete ideal para tal música, que pedia uma cantora menos cool (e com mais suingue).
Graciosa, Fernanda Takai se saiu bem ao interpretar, a seu modo, Lugar Comum, Nunca Mais e Gaiolas Abertas. Depois, chamou ao palco Marcelo Camelo, anunciado como "um garoto novo e talentoso". Foi então que o público foi submetido a novos momentos constrangedores. Olhando para o chão, cantando baixo, e ainda por cima enfrentando o som picotado, Camelo balbuciou os versos de músicas como Brisa do Mar e Simples Carinho. Pela dança estranha que fazia no palco, devia achar que estava agradando. Mas o Municipal não é reduto de muderninhos e o que se viu foi um intérprete totalmente desencontrado e deslocado que em nada lembrava o vocalista carismático do grupo Los Hermanos. Camelo conseguiu destruir músicas lindas...
Felizmente, Roberta Sá - saudada por Camelo como "o rouxinol da noite" - entrou em cena e devolveu o tributo aos eixos. Com segurança e suingue, Sá entoou Não Tem Nada, Não (uma das músicas mais obscuras do roteiro), Minha Saudade e Sambou, Sambou (seu melhor momento, inclusive porque o samba é talhado para sua voz). Na seqüência, Camelo voltou à cena para dueto com a cantora em Chorou, Chorou - estrategicamente posicionado no fim do belo bloco de Roberta para possibilitar a entrada de Donato em cena para o set final. E ele reinou no palco...
Com todo o elenco no palco, Donato tocou Ê Menina, número em que as cantoras fizeram o gracioso papel de backing-vocals. Em seguida, Marcelo D2 - subaproveitado no roteiro - não teve a chance de mostrar toda a beleza de Balança, Menina, sua parceria com Donato. Foram as cantoras que, novamente, dominaram a cena em A Paz. Seus vocais em uníssono resultaram sedutores. Mas na música seguinte, Nasci para Bailar, D2 deu a volta por cima ao improvisar um rap e foi merecidamente ovacionado. Aliás, o clima do número era de improviso, deixando a sensação de que o tributo a João Donato não foi suficientemente ensaiado. Entre altos e baixos, salvou-se o balanço cativante da obra do homenageado, a rigor bem superior à nova geração. Viva Donato!