Resenha de Show - Gravação de DVDTítulo: Uma Prova de AmorArtista: Zeca PagodinhoLocal: Citibank Hall (RJ)Data: 10 de julho de 2009Cotação: * * * 1/2"Tem gente filmando a gente, mané... Manera, mané, manera...", cantarolou Zeca Pagodinho logo após entrar em cena no palco do Citibank Hall, no Rio de Janeiro (RJ), e abrir o show com apática interpretação do samba Deixa a Vida me Levar. Cantarolar os versos de Manera Mané - o samba de Beto sem Braço, Serginho Meriti e Arlindo Cruz gravado por Zeca em 1988 em seu terceiro álbum, Jeito Moleque - foi a forma espirituosa encontrada pelo sambista para informar ao público que se aglutinava na pista de que aquela apresentação do show Uma Prova de Amor seria diferente porque estava sendo gravada para gerar DVD e CD ao vivo. Não que o público já não soubesse. Mas Zeca, do seu jeito espontâneo, fez questão de dar seu recado: o show seria mais "calmo", com as necessárias interrupções para repetir os números que não forem bem captados. Mas elas, as repetições, nem foram muitas. O cantor parecia à vontade, embora não tenha escondido o nervosismo na hora de receber Jorge Ben Jor - que recita em Ogum a mesma oração declamada no CD de estúdio homônimo do show - e, sobretudo, na hora de apresentar o (delicioso) samba inédito, Se Ela Não Gosta de mim, composto recentemente com Arlindo Cruz e Junior Dom com fidelidade à receita ensinada pelos bambas do Cacique de Ramos. Tanto Ogum quanto Se Ela Não Gosta de mim foram repetidos, mas o fato é que a gravação até transcorreu ágil e, descontado o bis usado para os necessários ajustes, o show durou as cerca de duas horas regulamentares. Dez!
Como Zeca já tem três DVDs em sua videografia, pareceu ter havido a preocupação de não deixar redundante o roteiro urdido pelo diretor Túlio Feliciano. O que explicaria a inclusão de temas menos inspirados do repertório de Zeca, caso de Alô, Mundo - o samba de temática social que deu título ao álbum gravado pelo artista em 1993. Pretexto para um discurso pacifista feito por Zeca em cena. O roteiro, a propósito, segue linha bem politizada em números ocasionais como Eta Povo pra Lutar e Maneiras, o samba do segundo álbum de Zeca (Patota de Cosme, 1987) que o artista regravaria anos depois com o grupo O Rappa. Aliás, Patota de Cosme - o samba - é revivido no show, abrindo o bloco religioso que alinha Ogum (com a luxuosa participação de Jorge Ben Jor, bem emendada num improvisado Taj Mahal) e Minha Fé.
Musicalmente, os arranjos combinam metais com percussão em sambas como Não Sou Mais Disso, cruzando o universo das gafieiras (mote do último registro ao vivo do cantor) com a batucada dos pagodes armados nos fundos de quintais. Como cantor, Zeca tem deficiências que saltam aos ouvidos no palco, mas que, em sambas populares como Vai Vadiar, são abafadas pelo coro espontâneo do público. Que recebe de forma calorosa os convidados Almir Guineto (em Lama das Ruas, parceria de Zeca com Guineto que também se junta ao time de sambas sociais do show), Monarco (debilitado, mas ainda majestoso, em Coração em Desalinho) e a Velha Guarda da Portela (vibrante como de hábito em Esta Melodia e em Vivo Isolado do Mundo). É comovente a reverência de Zeca ao grupo de bambas, saudado em cena como "meu baú de jóias". Entre hits já inevitáveis como Verdade e temas que podem virar hits além das rodas de samba se forem bem trabalhados na mídia (caso de O Canto da Sereia, de Toninho Geraes), Zeca Pagodinho deu seu recado, inclusive social, sem sair do (seu) tom, provando mais uma vez ser sambista fiel a si mesmo.