5 de outubro de 2008

'Loki' expõe lucidez insana da mente de Arnaldo

Resenha de filme
Título: Loki
- Arnaldo Baptista
Direção: Paulo
Henrique Fontenelle
Cotação: * * * * *
Em exibição no Festival
do Rio 2008
* 5 de outubro (Odeon,
às 15h45m)
* 6 de outubro
(Estação Vivo Gávea 3,
às 13h e 20h)

"Minha alegria são as etapas vencidas", admite Arnaldo Dias Baptista, eterno mutante, logo num dos takes iniciais de Loki, arrebatador documentário produzido pelo Canal Brasil sobre uma vida que, como ressalta Lobão, foi sublimada na forma de Arte. Ao costurar depoimentos com fartas e raras imagens de arquivo, o diretor Paulo Henrique Fontenelle expõe a lucidez insana da mente de Arnaldo, merecidamente saudado no filme como o artista que deu identidade brasileira ao rock através do conjunto Os Mutantes, ápice de trajetória musical que, de forma simbólica, começa na infância, quando, no alto de uma roda-gigante, Arnaldo ouviu Elvis Presley (1935 - 1977). "Eu me senti vivo", recorda. Na roda-viva do mundo adulto, Arnaldo, adolescente, formaria o grupo The Thunders, que desembocaria no conjunto O' Seis (já com Rita Lee), que, por sua vez, seria o embrião dos revolucionários Mutantes. "A cabeça dos Mutantes era a de Arnaldo Baptista", sentencia o maestro tropicalista Rogério Duprat (1932 - 2006), acrescentando que o trio paulista foi o elemento mais importante da geléia geral brasileira arquitetada por Caetano Veloso e Gilberto Gil em 1967. Loki, a propósito, reproduz trechos da histórica apresentação de Domingo no Parque no III Festival de Música Popular da Brasileira, exibido pela TV Record em 1967. Foi quando Gilberto Gil se aliou ao trio para derrubar o muro que separava o rock da música brasileira. Ao imediato estouro dos Mutantes, vieram, na seqüência, as viagens alucinógenas a bordo de LSD. "As drogas somente atrapalharam. Foi o começo do fim", interpreta o produtor Liminha, na época baixista dos Mutantes. Sem fazer julgamento moral, o filme enfatiza através dos depoimentos o prejuízo que as drogas causaram na mente de Arnaldo. Sobretudo depois que Rita Lee, o primeiro idealizado amor do artista, saltou fora dos Mutantes e da vida de Arnaldo. Não necessariamente nessa ordem. Loki, aliás, acerta ao não tomar posição em relação à ainda controvertida saída de Rita da banda. Se a Ovelha Negra (que se recusou a falar sobre o assunto para o filme) sustenta em entrevistas que foi expulsa por Arnaldo e Sérgio Dias Baptista, então decididos a guiar os Mutantes por trilhas mais progressivas, Liminha e o baterista Dinho Leme afirmam lembrar do momento em que a cantora comunicou aos colegas que estava saindo do grupo. Já Sérgio Dias dá a entender que a versão da expulsão é mais uma das fantasias da teatral Rita.
Espontânea ou não, a saída de Rita Lee do grupo ajudou a desintegrar a mente de Arnaldo Baptista. Tanto que o artista, depressivo, logo sairia dos Mutantes e gravaria um estupendo primeiro disco solo, Loki (1974), em cujas desiludidas letras expôs sua fratura emocional. A crise se agravaria a ponto de Arnaldo não fazer seu agendado show no Festival de Águas Claras, em 1975. Contudo, da efêmera união do artista com a atriz Martha Mellinger, nasceria em abril de 1977 Daniel, único filho de Arnaldo e, naquele momento, único ponto de equilíbrio na confusão de sua vida. Nem a formação de uma nova banda, a Patrulha do Espaço, deu novo prumo à carreira de Arnaldo, que, em 31 de dezembro de 1981, dia do aniversário de Rita Lee, tentou o suicídio ao se atirar do quarto andar de um hospital psiquiátrico. "Eu me joguei da janela", assume Arnaldo. Contudo, o jogo da vida ainda não estava perdido para o mutante. No longo período de convalescença, entrou em cena Lucinha Barbosa, fã que viria a se tornar a dedicada mulher do artista. Em seu refúgio em Juiz de Fora (MG), amparado por Lucinha, "sem ligação com o passado", como ela enfatiza em seu depoimento, Arnaldo foi reorganizando sua mente num universo todo particular, com o auxílio da pintura. Até a volta consagradora em 2006 com a reunião dos Mutantes para show em Londres, idealizado dentro de evento em homenagem à Tropicália. A volta se estendeu ao Brasil e, em janeiro de 2007, um show ao ar livre reuniu 80 mil pessoas em São Paulo (SP) em torno dos Mutantes. Foi, no entender apropriado de Tom Zé, o fecho de um ciclo na carreira de Arnaldo.
Ao fim do filme, de todo comovente pela história naturalmente interessante do artista, Zélia Duncan - mutante temporária, recrutada para assumir no show de 2006 o posto de vocalista recusado por Rita Lee - sintetiza muito do visto e ouvido em duas horas de narrativa ao dizer que o legado de Arnaldo Baptista é a liberdade. Loki seduz ao expor sem firula a saga de um artista que venceu etapas e - hoje já alegre - celebra a eterna mutação da vida.

11 Comments:

Blogger Mauro Ferreira said...

"Minha alegria são as etapas vencidas", admite Arnaldo Dias Baptista, eterno mutante, logo num dos takes iniciais de Loki, arrebatador documentário produzido pelo Canal Brasil sobre uma vida que, como ressalta Lobão, foi sublimada na forma de Arte. Ao costurar depoimentos com fartas e raras imagens de arquivo, o diretor Paulo Henrique Fontenelle expõe a lucidez insana da mente de Arnaldo, merecidamente saudado no filme como o artista que deu identidade brasileira ao rock através do conjunto Os Mutantes, ápice de trajetória musical que, de certa simbólica, começa na infância, quando, no alto de uma roda-gigante, Arnaldo ouviu Elvis Presley (1935 - 1977). "Eu me senti vivo", recorda. Na roda-viva do mundo adulto, Arnaldo, adolescente, formaria o grupo The Thunders, que desembocaria no conjunto O' Seis (já com Rita Lee), que, por sua vez, seria o embrião dos revolucionários Mutantes. "A cabeça dos Mutantes era a de Arnaldo Baptista", sentencia o maestro tropicalista Rogério Duprat (1932 - 2006), acrescentando que o trio paulista foi o elemento mais importante da geléia geral brasileira arquitetada por Caetano Veloso e Gilberto Gil em 1967. Loki, a propósito, reproduz trechos da histórica apresentação de Domingo no Parque no III Festival de Música Popular da Brasileira, exibido pela TV Record em 1967. Foi quando Gilberto Gil se aliou ao trio para derrubar o muro que separava o rock da música brasileira. Ao imediato estouro dos Mutantes, vieram, na seqüência, as viagens alucinógenas a bordo de LSD. "As drogas somente atrapalharam. Foi o começo do fim", interpreta o produtor Liminha, na época baixista dos Mutantes. Sem fazer julgamento moral, o filme enfatiza através dos depoimentos o prejuízo que as drogas causaram na mente de Arnaldo. Sobretudo depois que Rita Lee, o primeiro idealizado amor do artista, saltou fora dos Mutantes e da vida de Arnaldo. Não necessariamente nessa ordem. Loki, aliás, acerta ao não tomar posição em relação à ainda controvertida saída de Rita da banda. Se a Ovelha Negra (que se recusou a falar sobre o assunto para o filme) sustenta em entrevistas que foi expulsa por Arnaldo e Sérgio Dias Baptista, então decididos a guiar os Mutantes por trilhas mais progressivas, Liminha e o baterista Dinho Leme afirmam lembrar do momento em que a cantora comunicou aos colegas que estava saindo do grupo. Já Sérgio Dias dá a entender que a versão da expulsão é mais uma das fantasias da teatral Rita.
Espontânea ou não, a saída de Rita Lee do grupo ajudou a desintegrar a mente de Arnaldo Baptista. Tanto que ele, depressivo, logo sairia dos Mutantes e gravaria um estupendo primeiro disco solo, Loki (1974), em cujas desiludidas letras expôs sua fratura emocional. A crise se agravaria a ponto de Arnaldo não fazer seu agendado show no Festival de Águas Claras, em 1975. Contudo, da efêmera união do artista com a atriz Martha Mellinger, nasceria em abril de 1977 Daniel, único filho de Arnaldo e, naquele momento, único ponto de equilíbrio na confusão de sua vida. Nem a formação de uma nova banda, a Patrulha do Espaço, deu novo prumo à carreira de Arnaldo, que, em 31 de dezembro de 1982, dia do aniversário de Rita Lee, tentou o suicídio ao se atirar do quarto andar de um hospital psiquiátrico. "Eu me joguei da janela", assume Arnaldo. Contudo, o jogo da vida ainda não estava perdido para o mutante. No longo período de convalescença, entrou em cena Lucinha Barbosa, fã que viria a se tornar a dedicada mulher do artista. Em seu refúgio em Juiz de Fora (MG), amparado por Lucinha, "sem ligação com o passado", como ela enfatiza em seu depoimento, Arnaldo foi reorganizando sua mente num universo todo particular, com o auxílio da pintura. Até a volta consagradora em 2006 com a reunião dos Mutantes para show em Londres, idealizado dentro de evento em homenagem à Tropicália. A volta se estendeu ao Brasil e, em janeiro de 2007, um show ao ar livre reuniu 80 mil pessoas em São Paulo (SP) em torno dos Mutantes. Foi, no entender apropriado de Tom Zé, o fecho de um ciclo na carreira de Arnaldo.
Ao fim do filme, de todo comovente pela história naturalmente interessante do artista, Zélia Duncan - mutante temporária, recrutada para assumir no show de 2006 o posto de vocalista recusado por Rita Lee - sintetiza muito do visto e ouvido em duas horas de narrativa ao dizer que o legado de Arnaldo Baptista é a liberdade. Loki seduz ao expor sem firula a saga de um artista que venceu etapas e - hoje já alegre - celebra a eterna mutação da vida.

5 de outubro de 2008 às 11:41  
Anonymous Anônimo said...

será que o filme vai ter alcance nacional? gostaria de saber se por exemplo vai passar no canal brasil ou algo do gênero.

5 de outubro de 2008 às 12:44  
Anonymous Anônimo said...

Claro que posso estar certo,mas realmente acho que a Rita foi expulsa,não só pela história ser a mais lógica e com chances de ser verdade,como pela forma que ela encarou essa volta dos Mutantes.Até pq não entendo pq ela criaria isso tudo se simplesmente quisesse sair da banda...

5 de outubro de 2008 às 19:25  
Anonymous Anônimo said...

Arnaldo diz que ele expulsou Rita.
Rita diz que foi expulsa.
Sergio diz que quando chegou ao ensaio Rita saia e disse que estava fora - sem falar que foi expulsa.
Liminha e Dinho estava ensaiando e não ouviram a briga de Arnaldo e Rita, quando viram Rita já não estava.

Rita pode ter ficado sentida com todos por não a terem defendido, mas acho claro que se trata de uma briga entre ela e Arnaldo. Dificil, já que foram o primeiro amor um do outro. Duas personalidades imensas, dificeis, passionais e geniais. Perfeitas em harmonia e trágicas em desharmonia.

7 de outubro de 2008 às 19:30  
Anonymous Anônimo said...

Sejamos sinceros: Arnaldo é a única personalidade do que se convencionou chamar "rock brasileiro" que merece o rótulo de "lenda viva". Mais do que Rita. Mais do que Raul.

Foi tão fundo na viagem que quase perdeu a vida. Menos mal que pôde reconstrui-la.

Ah, sim: Mauro, o post já esfriou, mas há um errinho. Arnaldo se jogou da janela do Hospital do Servidor Público de São Paulo em 31 de dezembro, mas foi de 1981, não de 1982.

Felipe dos Santos Souza

8 de outubro de 2008 às 08:22  
Anonymous Anônimo said...

Sejamos sinceros. Os Mutantes só foram o que foram em sua maior parte pela graça de Rita Lee. Tanto é que com a expulsão dela, o grupo se tornou apenas mais uma banda de rock underground chato sem nenhuma repercussão, enquanto Rita caminhou à passos largos para o estrelato, posição em que se mantêm até hoje. E a grande prova de que a fase de relevância dos Mutantes foi a fase COM Rita é que nesse revival com Zélia Duncan, só foram resgatadas músicas da fase anterior à saída de Rita. Realmente os irmãos Pabtista sempre foram dois músicos talentosos, mas a grande artista dos Mutantes chama-se Rita Lee Jones. O resto é birra de roqueiro radical.

8 de outubro de 2008 às 14:10  
Anonymous Anônimo said...

Não importa quem expulsou quem, quem brilhou mais, quem se drogou mais, o que importa é que o documentário é o máximo!!!

8 de outubro de 2008 às 21:17  
Blogger Moni said...

"LOKI - Arnaldo Baptista" no cinema JÁÁÁÁÁÁÁÁÁ!!!!!!!!
"LOKI-Arnaldo Baptista" - o longa documentário - só passou pelos festivais no Rio, SP e MG, mas muita gente não assistiu. As comus no orkut e alguns blogs estão se manifestando para que o filme entre em cartaz. A proposta é fazer o pedido para exibição no grande circuito na caixa de e-mail - "fale conosco" no site http://globosat.globo.com/canalbrasil/ , e fazer com que o filme tenha o destino merecido: as telas dos cinemas.! Faça sua manifestação em "fale conosco" bem no final da página http://globosat.globo.com/canalbrasil/ Agradecemos o apoio

7 de novembro de 2008 às 23:37  
Blogger Unknown said...

Eu vi o documentário, adorei... não conhecia muito o Arnaldo pq nasci no final de 1967, acompanhei a carreira solo de Rita e sempre gostei muito dela como artista, a parte das drogas, eu acho uma "droga" pq elas fazem pessoas talentosas e maravilhosas se perderem e eu acho uma pena...Agora o que eu fiquei intrigada, não que seja da minha conta, mas o filho do Arnaldo e a mãe dele aparecem no filme, mas depois simplesmente corta-se e não ficamos sabendo o que aconteceu com ele, tive até a impressão que ele morreu...ele não aparece pra falar nada do pai...alguém sabe alguma coisa sobre o Daniel????
Obrigada e parabéns pelo blog.

21 de junho de 2009 às 14:10  
Blogger j.luiz said...

O grupo Mutantes foi a síntese de um encontro mágico entre Arnaldo, Sergio e Rita, que contou com a retaguarda competente de Dinho e Liminha.

Esse encontro, como tudo na vida, teve um ciclo que se encerrou. O resto, é o que já sabemos.

19 de setembro de 2009 às 09:41  
Blogger DigitalBat said...

Marciamaff, é verdade!! Eu também fiquei intrigado sobre o porque do filho dele nao aparecer...

Já busquei na web algo sobre isso mas nao achei nada.

31 de março de 2010 às 10:14  

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