16 de dezembro de 2008

Camaleão expõe todas as faces do mutante Ney


Resenha de Caixa de CDs
Título: Camaleão
Artista: Ney Matogrosso
Gravadora: Universal Music
Cotação da caixa: * * * * 1/2
Um dos fatos mais revelantes do mercado fonográfico brasileiro em 2008, as chegada às lojas da caixa Camaleão - que embala reedições de 15 discos de carreira de Ney Matogrosso, lançados originalmente entre 1975 e 1991 - dá tardio tratamento digno a uma obra que tinha chegado apenas parcialmente ao formato digital e, mesmo assim, em reedições desleixadas. Além de recuperar todo o material gráfico dos LPs originais (inclusive os selos dos vinis, reproduzidos nos CDs), as reedições trazem textos do jornalista Rodrigo Faour, idealizador da coleção, sobre cada um dos 15 álbuns, remasterizados com apuro. Com a ressalva de que os três primeiros títulos da discografia solo do cantor - Água do Céu-Pássaro (1975), Bandido (1976) e Pecado (1977), até então inéditos em CD - foram reeditados a partir de áudios de cópias de LPs, já que as matrizes originais - pertencentes ao acervo da extinta Continental, herdado pela Warner Music - se deterioraram. Obviamente, o som destes três títulos, embora satisfatórios levando-se em conta as precárias condições técnicas, soam mais abafados. Áudios à parte, Camaleão expõe em 15 discos todas as faces do mutante cantor. Intérprete de natureza camaleônica, inclassificável, Ney Matogrosso transitou entre a MPB e o pop, mas sempre com atitude roqueira, às vezes até trangressora, sobretudo nos anos 70, quando desafiou a censura da época com repertório e postura de alta carga erótica. Eis os álbuns reeditados na caixa e suas respectivas cotações (dadas pelo conteúdo artístico do CD, e não pelo aspecto técnico da reedição):
Água do Céu-Pássaro (1975) * * * *
Em sua ousada estréia solo, de sonoridade urdida com ruídos e textura vanguardista, Ney Matogrosso cantou músicas de João Bosco e Aldir Blanc (Corsário) e Milton Nascimento (Bodas, com Ruy Guerra). As faixas mais populares foram América do Sul e o mambo Coubanakan. A reedição inclui As Ilhas e 1964 (II), as duas músicas do compacto gravado em 1974 (e encartado no LP).
Bandido (1976) * * * 1/2
Por conta da faixa Bandido Corazón, pérola pop de Rita Lee, Ney Matogrosso conseguiu sucesso radiofônico com este segundo álbum solo, produzido por Guilherme Araújo sob a direção musical da violonista Rosinha de Valença (1941 - 2004), autora da faixa Usina de Prata. Embora ligeiramente irregular, o repertório destacou também Mulheres de Atenas (grande presente de Chico Buarque), A Gaivota (canção de Gilberto Gil, tão bela quanto desconhecida) e Trepa no Coqueiro, veículo para Ney exercer a malícia e a sensualidade que pontuavam seu canto naquela época.
Pecado (1977) * * * *
De novo com repertório à altura de sua voz, pescado no roteiro do consagrador show Bandido (1976), Ney Matogrosso gravou este terceiro disco solo, o último feito pela extinta gravadora Continental. Um dos destaques é a sensual releitura de Da Cor do Pecado (Bororó) - uma das faixas feitas para um especial gravado para a TV Bandeirantes. Pecado misturava rock (Metamorfose Ambulante, Com a Boca no Mundo) com bossa nova (Desafinado) e a latinidade que identificava e unia a América do Sul na discografia de Ney (San Vicente e a regravação de Sangue Latino, hit do grupo Secos & Molhados). Fechando o disco, o cantor pintava Retrato Marrom com as tintas fortes do tango argentino.
Feitiço (1978) * * * * 1/2
Em sua estréia na Warner Music, Ney Matogrosso foi produzido pela primeira vez por Mazzola, nome que seria recorrente na sua discografia daí em diante. O repertório, inspirado, projetou hits como a flamenca Bandolero, o samba-choro O Tic-Tac do meu Coração (sucesso de Carmen Miranda em 1935), a canção Mal Necessário (revivida pelo cantor em 2007 no politizado show Inclassificáveis) e o frevo Não Existe Pecado ao Sul do Equador, gravado com arranjo que evoca a batida da disco music que, na época, já tomava conta do Brasil. A releitura do tema de Chico Buarque e Ruy Guerra impulsionou as vendas do álbum e foi projetada em escala nacional na abertura da novela Pecado Rasgado, exibida pela Rede Globo em 1978. Feitiço já tinha saído em CD em 1996 na série 2 É Demais!, da Warner Music. Dez!!
Seu Tipo (1979) * * * *
Pela primeira vez, Ney Matogrosso tirou a maquiagem e a fantasia para se mostrar de cara limpa. Seu Tipo é um disco mais cool do que os álbuns anteriores do cantor. No repertório, puxado pela faixa-título (da lavra do então desconhecido Eduardo Dusek, em parceria com Luiz Carlos Góes), o cantor gravou Joyce (Ardente) e Fátima Guedes (Dor Medonha), compositoras que despontavam na emergente cena feminina de 1979. Curiosidade: Joyce assinou também o arranjo da regravação de Rosa de Hiroshima. Havia conotação gay no álbum, mais perceptível em Encantado, versão de Caetano Veloso para Nature Boy, sucesso de Nat King Cole. Seu Tipo havia sido reeditado em CD na série Arquivos Warner.
Sujeito Estranho (1980) * * * 1/2
Com a saída de Mazzola da Warner Music, Ney Matogrosso gravou sob a produção de Gutti Carvalho este que é seu disco mais desconhecido. Inédito em CD, Sujeito Estranho foi o último álbum feito por Ney para a Warner. Não fez muito sucesso. A gravação mais conhecida é Napoleão, da dupla Luli & Lucina, fiel fornecedora de bom repertório para o cantor. Ney regravou duas músicas do primeiro álbum de Ângela RoRo, Balada da Arrasada e Não Há Cabeça. O repertório de Sujeito Estranho foi todo montado com as músicas do roteiro do show Seu Tipo que não tinham sido gravadas no disco homônimo e inclui Doce Vampiro.
Ney Matogrosso (1981) * * * * *
Disco esfuziante que marcou a estréia de Ney Matogrosso na efêmera gravadora Ariola, para onde o cantor se transferiu na intenção de voltar a trabalhar com o produtor Mazzola. A sonoridade já roçava o tecnopop que daria o tom da música brasileira nos anos 80, mas os arranjos de César Camargo Mariano e Lincoln Olivetti eram criativos e exuberantes como o disco. Os maiores êxitos do irretocável repertório foram Viajante (a bela e poética canção de Teresa Tinoco), Amor Objeto (delícia pop da dupla Rita Lee e Roberto de Carvalho), Folia no Matagal (a maliciosa marchinha de Eduardo Dusek e Luiz Carlos Góes que Maria Alcina gravara em 1979 sem a menor repercussão), Vida, Vida (tema de abertura da novela global Jogo da Vida) e, claro, Homem com H, o tema forrozeiro que Ney gravou depois de muita insistência e que se tornou um dos maiores sucessos de seus 35 anos de carreira. Ney Matogrosso havia sido reeditado em CD.
Mato Grosso (1982) * * * 1/2
Disco que repetiu a fórmula festiva do anterior Ney Matogrosso sem, no entanto, reeditar o completo êxito artístico do álbum de 1981. Por Debaixo dos Panos foi gravado na cola de Homem com H e se tornou o maior sucesso radiofônico do trabalho pilotado por Mazzola. Como no álbum anterior, uma faixa (Promessas Demais) também foi parar em abertura de novela da Rede Globo (Paraíso). O destaque em termos artístico é a releitura abolerada de Tanto Amar, tema caribenho de Chico Buarque. Pura sedução!
... Pois É (1983) * * *
Mais um disco que perseguiu a alegre receita dos dois álbuns anteriores (que começou a soar batida...). Para festejar a primeira feliz década de carreira fonográfica, Ney Matogrosso empilhou sucessos no pot-pourri que abria o disco. Contudo, ...Pois É foi bem-sucedido nas rádios por conta da inclusão do rock Pro Dia Nascer Feliz - que iria despertar a atenção do Brasil para o som do Barão Vermelho e as letras de Cazuza (1958 - 1990) - e da paródica versão de Tell me Once Again, intitulada Calúnias (Telma, Eu Não Sou Gay), incluída no disco à revelia do cantor e, por isso mesmo, excluída dessa reedição (mas para sempre linkada à voz de Ney).
Destino de Aventureiro (1984) * * *
A fórmula esfuziante que deu o tom da obra de Ney Matogrosso na primeira metade dos anos 80 começou a dar fortes sinais de desgaste neste álbum de 1984, cujo repertório incluiu músicas do show inspirado no disco anterior ...Pois É. O cantor recorreu mais uma vez ao repertório do Barão Vermelho (Por que a Gente É Assim?), mas sem reeditar o impacto de Pro Dia Nascer Feliz. A faixa que garantiu alguma visibilidade para Destino de Aventureiro foi o bolero Vereda Tropical, gravado pelo cantor sob encomenda da TV Globo para abertura da novela homônima.
Bugre (1986) * * * 1/2
Com a expansão do mercado fonográfico para o rock brasileiro, Ney Matogrosso ousou fazer um disco radicalmente pop, quebrando com a seqüência de álbuns esfuziantes. Os arranjos foram urdidos com altas doses de eletrônica. No repertório, o cantor se aventurava como compositor e assinava músicas com Leoni e a dupla Paulo Ricardo e Luiz Schiavon. O sucesso comercial de Bugre foi a releitura tecnopop da Balada do Louco, hit do grupo Os Mutantes, mas o disco (a rigor, incompreendido por público e crítica) guarda pérolas como Fratura (Não) Exposta. O samba-enredo História do Brasil destoa do tom pop do bom álbum, assim como a rumba Las Muchachas de Copacabana.
Pescador de Pérolas (1987) * * * * *
Com o relativo fracasso de Bugre, Ney Matogrosso se desligou da gravadora PolyGram e assinou com a CBS para lançar este disco gravado ao vivo no show feito por Ney com o pianista Arthur Moreira Lima, o percussionista Chacal, o violonista Raphael Rabello (1962 - 1995) e o saxofonista Paulo Moura. Como fizera no disco/show Seu Tipo, em 1979, o cantor voltava a encarar o palco e o público sem fantasias e sem adereços. Desta vez, o repertório incluía apenas clássicos da música brasileira. Luxo só!
Quem Não Vive Tem Medo da Morte (1988) * * * * 1/2
Motivado pelo êxito comercial e artístico de Pescador de Pérolas, Ney Matogrosso gravou um de seus discos mais densos. Até então lançado em CD apenas numa pequena tiragem produzida na época de seu lançamento, Quem Não Vive Tem Medo da Morte combinou no repertório músicas de Cazuza (Tudo É Amor, parceria com Laura Finochiaro), Caetano Veloso (Dama do Cassino, presente do compositor para Ney) e Itamar Assumpção (Chavão Abre Porta Grande). Nem as duas músicas impostas pela gravadora CBS, Vamos pra Lua e Caro Amigo, tiram o brilho sombrio do álbum. Infelizmente, não obteve repercussão.
Ao Vivo (1989) * * * *
Título menos raro da caixa Camaleão, este disco ao vivo foi gravado por Ney Matogrosso para encerrar seu contrato com a gravadora CBS. O show - captado na casa Olympia (SP) em 11 e 12 de março de 1989 - sintetizava no roteiro a natureza mutante da obra de Ney, de novo coberto por figurino espalhafatoso. Mas nem todo o repertório teve caráter retrospectivo. Antenado com a cena pop dos anos 80, Ney registrou pela primeira vez músicas dos grupos Os Titãs (Comida) e Os Paralamas do Sucesso (O Beco).
À Flor da Pele (1991) * * * * *
A sós com o violonista Raphael Rabello, Ney Matogrosso tirou novamente a fantasia para retomar a linha camerística do projeto Pescador de Pérolas e registrar em disco, para a gravadora Som Livre, o impecável repertório de clássicos da MPB que apresentava no show feito com Rabello. À Flor da Pele é o título mais recente da bela caixa Camaleão. Obra-prima que conciliou êxito artístico e resultado comercial. Fecho de ouro para a caixa!!

20 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Mauro, parabéns pelas resenhas de cada LP, bastante informativas.

Só faço uma retificação: a música de Fátima Guedes registrada em "Seu Tipo" é "Dor MEDONHA", não "Dor Estranha".

E concordo: o álbum de 1981 é papa finíssima. Cesar Mariano e Lincoln Olivetti inspiradíssimos.

Felipe dos Santos Souza

16 de dezembro de 2008 às 16:54  
Anonymous Anônimo said...

Mauro,

A melhor resenha que você já fez em todos os tempos, na minha opinião.

Parabéns...

abração,
Denilson

16 de dezembro de 2008 às 16:56  
Blogger Mauro Ferreira said...

Um dos fatos mais revelantes do mercado fonográfico brasileiro em 2008, as chegada às lojas da caixa Camaleão - que embala reedições de 15 discos de carreira de Ney Matogrosso, lançados originalmente entre 1975 e 1991 - dá tardio tratamento digno a uma obra que tinha chegado apenas parcialmente ao formato digital e, mesmo assim, em reedições desleixadas. Além de recuperar todo o material gráfico dos LPs originais (inclusive os selos dos vinis, reproduzidos nos CDs), as reedições trazem textos do jornalista Rodrigo Faour, idealizador da coleção, sobre cada um dos 15 álbuns, remasterizados com apuro. Com a ressalva de que os três primeiros títulos da discografia solo do cantor - Água do Céu-Pássaro (1975), Bandido (1976) e Pecado (1977), até então inéditos em CD - foram reeditados a partir de áudios de cópias de LPs, já que as matrizes originais - pertencentes ao acervo da extinta Continental, herdado pela Warner Music - se deterioraram. Obviamente, o som destes três títulos, embora satisfatórios levando-se em conta as precárias condições técnicas, soam mais abafados. Áudios à parte, Camaleão expõe em 15 discos todas as faces do mutante cantor. Intérprete de natureza camaleônica, inclassificável, Ney Matogrosso transitou entre a MPB e o pop, mas sempre com atitude roqueira, às vezes até trangressora, sobretudo nos anos 70, quando desafiou a censura da época com repertório e postura de alta carga erótica. Eis os álbuns reeditados na caixa e suas respectivas cotações (dadas pelo conteúdo artístico do CD, e não pelo aspecto técnico da reedição):
Água do Céu-Pássaro (1975) * * * *
Em sua ousada estréia solo, de sonoridade urdida com ruídos e textura vanguardista, Ney Matogrosso cantou músicas de João Bosco e Aldir Blanc (Corsário) e Milton Nascimento (Bodas, com Ruy Guerra). As faixas mais populares foram América do Sul e o mambo Coubanakan. A reedição inclui As Ilhas e 1964 (II), as duas músicas do compacto gravado em 1974 (e encartado no LP).
Bandido (1976) * * * 1/2
Por conta da faixa Bandido Corazón, pérola pop de Rita Lee, Ney Matogrosso conseguiu sucesso radiofônico com este segundo álbum solo, produzido por Guilherme Araújo sob a direção musical da violonista Rosinha de Valença (1941 - 2004), autora da faixa Usina de Prata. Embora ligeiramente irregular, o repertório destacou também Mulheres de Atenas (presente de Chico Buarque), A Gaivota (canção de Gilberto Gil, tão bela quanto desconhecida) e Trepa no Coqueiro, veículo para Ney exercer a malícia e a sensualidade que pontuavam seu canto naquela época.
Pecado (1977) * * * *
De novo com repertório à altura de sua voz, pescado no roteiro do consagrador show Bandido (1976), Ney Matogrosso gravou este terceiro disco solo, o último feito pela extinta gravadora Continental. Um dos destaques é a sensual releitura de Da Cor do Pecado (Bororó) - uma das faixas feitas para um especial gravado para a TV Bandeirantes. Pecado misturava rock (Metamorfose Ambulante, Com a Boca no Mundo) com bossa nova (Desafinado) e a latinidade que identificava e unia a América do Sul na discografia de Ney (San Vicente e a regravação de Sangue Latino, hit do grupo Secos & Molhados). Fechando o disco, o cantor pintava Retrato Marrom com as tintas fortes do tango argentino.
Feitiço (1978) * * * * 1/2
Em sua estréia na Warner Music, Ney Matogrosso foi produzido pela primeira vez por Mazzola, nome que seria recorrente na sua discografia daí em diante. O repertório, inspirado, projetou hits como a flamenca Bandolero, o samba-choro O Tic-Tac do meu Coração (sucesso de Carmen Miranda em 1935), a canção Mal Necessário (revivida pelo cantor em 2007 no politizado show Inclassificáveis) e o frevo Não Existe Pecado ao Sul do Equador, gravado com arranjo que evoca a batida da disco music que, na época, já tomava conta do Brasil. A releitura do tema de Chico Buarque e Ruy Guerra impulsionou as vendas do álbum e foi projetada em escala nacional na abertura da novela Pecado Rasgado, exibida pela Rede Globo em 1978. Feitiço já tinha saído em CD em 1996 na série 2 É Demais!, da Warner Music. Dez!!
Seu Tipo (1979) * * * *
Pela primeira vez, Ney Matogrosso tirou a maquiagem e fantasia para se mostrar de cara limpa. Seu Tipo é um disco mais cool do que os álbuns anteriores do cantor. No repertório, puxado pela faixa-título (da lavra do então desconhecido Eduardo Dusek, em parceria com Luiz Carlos Góes), o cantor gravou Joyce (Ardente) e Fátima Guedes (Dor Medonha), compositoras que despontavam na emergente cena feminina de 1979. Curiosidade: Joyce assinou também o arranjo da regravação de Rosa de Hiroshima. Havia conotação gay no álbum, mais perceptível em Encantado, versão de Caetano Veloso para Nature Boy, sucesso de Nat King Cole. Seu Tipo havia sido reeditado em CD na série Arquivos Warner.
Sujeito Estranho (1980) * * * 1/2
Com a saída de Mazzola da Warner Music, Ney Matogrosso gravou sob a produção de Gutti Carvalho este que é seu disco mais desconhecido. Inédito em CD, Sujeito Estranho foi o último álbum feito por Ney para a Warner. Não fez muito sucesso. A gravação mais conhecida é Napoleão, da dupla Luli & Lucina, fiel fornecedora de repertório para o cantor. Ney regravou duas músicas do primeiro álbum de Ângela RoRo, Balada da Arrasada e Não Há Cabeça. O repertório de Sujeito Estranho foi todo montado com as músicas do roteiro do show Seu Tipo que não tinham sido gravadas no disco homônimo e inclui Doce Vampiro.
Ney Matogrosso (1981) * * * * *
Disco esfuziante que marcou a estréia de Ney Matogrosso na efêmera gravadora Ariola, para onde o cantor se transferiu na intenção de voltar a trabalhar com o produtor Mazzola. A sonoridade já roçava o tecnopop que daria o tom da música brasileira nos anos 80, mas os arranjos de César Camargo Mariano e Lincoln Olivetti eram criativos e exuberantes como o disco. Os maiores êxitos do irretocável repertório foram Viajante (a poética canção de Teresa Tinoco), Amor Objeto (delícia pop da dupla Rita Lee e Roberto de Carvalho), Folia no Matagal (a maliciosa marchinha de Eduardo Dusek e Luiz Carlos Góes que Maria Alcina gravara em 1979 sem a menor repercussão), Vida, Vida (tema de abertura da novela global Jogo da Vida) e, claro, Homem com H, o tema forrozeiro que Ney gravou depois de muita insistência e que se tornou um dos maiores sucessos de seus 35 anos de carreira. Ney Matogrosso havia sido reeditado em CD.
Mato Grosso (1982) * * * 1/2
Disco que repetiu a fórmula festiva do anterior Ney Matogrosso sem, no entanto, reeditar o completo êxito artístico do álbum de 1981. Por Debaixo dos Panos foi gravado na cola de Homem com H e se tornou o maior sucesso radiofônico do trabalho pilotado por Mazzola. Como no álbum anterior, uma faixa (Promessas Demais) também foi parar em abertura de novela da Rede Globo (Paraíso). O destaque em termos artístico é a releitura abolerada de Tanto Amar, tema caribenho de Chico Buarque. Pura sedução!
... Pois É (1983) * * *
Mais um disco que seguiu a alegre receita dos dois álbuns anteriores e que começou a soar batida. Para festejar a primeira década de carreira fonográfica, Ney Matogrosso empilhou sucessos no pot-pourri que abria o disco. Contudo, ...Pois É foi bem-sucedido nas rádios por conta da inclusão do rock Pro Dia Nascer Feliz - que iria despertar a atenção do Brasil para o som do Barão Vermelho e as letras de Cazuza (1958 - 1990) - e da paródica versão de Tell me Once Again, intitulada Calúnias (Telma, Eu Não Sou Gay), incluída no disco à revelia do cantor e, por isso mesmo, excluída dessa reedição (mas para sempre linkada à voz de Ney).
Destino de Aventureiro (1984) * * *
A fórmula esfuziante que deu o tom da obra de Ney Matogrosso na primeira metade dos anos 80 começou a dar fortes sinais de desgaste neste álbum de 1984, cujo repertório incluiu músicas do show inspirado no disco anterior ...Pois É. O cantor recorreu mais uma vez ao repertório do Barão Vermelho (Por que a Gente É Assim?), mas sem reeditar o impacto de Pro Dia Nascer Feliz. A faixa que garantiu alguma visibilidade para Destino de Aventureiro foi o bolero Vereda Tropical, gravado pelo cantor sob encomenda da TV Globo para abertura da novela homônima.
Bugre (1986) * * * 1/2
Com a expansão do mercado fonográfico para o rock brasileiro, Ney Matogrosso ousou fazer um disco radicalmente pop, quebrando com a seqüência de álbuns esfuziantes. Os arranjos foram urdidos com altas doses de eletrônica. No repertório, o cantor se aventurava como compositor e assinava músicas com Leoni e a dupla Paulo Ricardo e Luiz Schiavon. O sucesso comercial de Bugre foi a releitura tecnopop da Balada do Louco, hit do grupo Os Mutantes, mas o disco (a rigor, incompreendido por público e crítica) guarda pérolas como Fratura (Não) Exposta. O samba-enredo História do Brasil destoa do tom pop do bom álbum, assim como a rumba Las Muchachas de Copacabana.
Pescador de Pérolas (1987) * * * * *
Com o relativo fracasso de Bugre, Ney Matogrosso se desligou da gravadora PolyGram e assinou com a CBS para lançar este disco gravado ao vivo no show feito por Ney com o pianista Arthur Moreira Lima, o percussionista Chacal, o violonista Raphael Rabello (1962 - 1995) e o saxofonista Paulo Moura. Como fizera no disco/show Seu Tipo, em 1979, o cantor voltava a encarar o palco e o público sem fantasias e sem adereços. Desta vez, o repertório incluía apenas clássicos da música brasileira. Luxo só!
Quem Não Vive Tem Medo da Morte (1988) * * * * 1/2
Motivado pelo êxito comercial e artístico de Pescador de Pérolas, Ney Matogrosso gravou um de seus discos mais densos. Até então lançado em CD apenas numa pequena tiragem produzida na época de seu lançamento, Quem Não Vive Tem Medo da Morte combinou no repertório músicas de Cazuza (Tudo É Amor, parceria com Laura Finochiaro), Caetano Veloso (Dama do Cassino, presente do compositor para Ney) e Itamar Assumpção (Chavão Abre Porta Grande). Nem as duas músicas impostas pela gravadora CBS, Vamos pra Lua e Caro Amigo, tiram o brilho sombrio do álbum. Infelizmente, não obteve repercussão.
Ao Vivo (1989) * * * *
Título menos raro da caixa Camaleão, este disco ao vivo foi gravado por Ney Matogrosso para encerrar seu contrato com a gravadora CBS. O show - captado na casa Olympia (SP) em 11 e 12 de março de 1989 - sintetizava no roteiro a natureza mutante da obra de Ney, de novo coberto por figurino espalhafatoso. Mas nem todo o repertório teve caráter retrospectivo. Antenado com a cena pop dos anos 80, Ney registrou pela primeira vez músicas dos grupos Os Titãs (Comida) e Os Paralamas do Sucesso (O Beco).
À Flor da Pele (1991) * * * * *
A sós com o violonista Raphael Rabello, Ney Matogrosso tirou novamente a fantasia para retomar a linha camerística do projeto Pescador de Pérolas e registrar em disco, para a gravadora Som Livre, o impecável repertório de clássicos da MPB que apresentava no show feito com Rabello. À Flor da Pele é o título mais recente da bela caixa Camaleão. Obra-prima que conciliou êxito artístico e resultado comercial. Fecho de ouro para a caixa!!

16 de dezembro de 2008 às 17:11  
Anonymous Anônimo said...

Belo trabalho !

16 de dezembro de 2008 às 17:31  
Anonymous Anônimo said...

É "Seu" Mauro. Acertou em cheio. Quem sou eu, mas concordo com as resenhas e "notas" de cada obra.
Parece até combinado. Eu, hein!

16 de dezembro de 2008 às 17:35  
Anonymous Anônimo said...

Na minha opinião apenas BUGRE merece umas 2 estrelas....esse trabalho é muito chato. Muito pop com um repertório medíocre.

16 de dezembro de 2008 às 19:31  
Anonymous Anônimo said...

Por mais que eu adore o Ney, não conhecia vários desses discos. Vou procurá-los agora. Valeu, Mauro!

16 de dezembro de 2008 às 19:33  
Blogger Luiz Felipe Carneiro said...

Mauro,
parabéns pelo trabalho. Sensacional!
Abs,
Luiz Felipe.

16 de dezembro de 2008 às 23:50  
Anonymous Anônimo said...

Belo post, até pra mim que não curto muito o Ney.
Só na época dos Secos & Molhados.

PS: A caixa é plasticamente linda.

Ahhhh, me lembrei de uma estória do Dorival Caymmi.
Ele tava dando uma entrevista sobre o lançamento de sua caixa quando pegou-a e disse:
"Meu trabalho todo, anos de música, dentro dessa caixinha!?"
HEHEHEEHE
Falou isso em tom de lamento.

Jose Henrique

17 de dezembro de 2008 às 01:07  
Anonymous Anônimo said...

"Bugre" é seu pior - pior não, menos espetacular - trabalho, é verdade. MAS COMO É NEY CANTANDO...
PS: Ah, tem "Balada do Louco" numa gravação muito melhor que a dos "Mutantes". Fico com Mauro e a maioria: aprovado!

17 de dezembro de 2008 às 01:12  
Blogger Pedro Progresso said...

E essas capas, hein?

17 de dezembro de 2008 às 03:01  
Blogger Pedro Ferreira said...

Essa completíssima resenha ficará aqui guardada como referência para futuras buscas ou pesquisas sobre o grande Ney.

17 de dezembro de 2008 às 04:54  
Anonymous Anônimo said...

Apesar de linda, não acho que a caixa "expõe todas as faces" de Ney. Mesmo porque seria impossível registrar todas as tonalidades de um artista multifacetado como Ney Matogrosso. Penso que "Camaleão" expõe muitas fases importantes dele, e percebe-se bem nestes cds, o qto Ney influenciou uma enorme quantidade de cantores (as). Com sua absolutamente destemida escolha de repertório (ele nunca temeu riscos), misturando rock, bolero, tango, samba, mambo, modinha, etc, e suas interpretações ousadas, Ney ensinou às antigas e novas gerações, que toda singularidade é possível. E necessária.

17 de dezembro de 2008 às 05:24  
Anonymous Anônimo said...

Na minha opinião mil estrelas seria pouco pra qualificar "Àgua do céu-pássaro". Que disco incrível, radical em sua proposta, coisa que não se vê nos dias atuais. Que ousadia e que maturidade pra um disco-solo de estréia. O som está bom, e o fato de ter sido captado de Lp, não compromete a excelente qualidade dele. Adorei "Feitiço", delicioso, pra mim, o cd mais sensual da caixa. Em "Seu tipo" Ney tá cantando divinamente, mas isso ele faz sempre, né?!
Vc deve ter razão em afirmar que "Bugre" foi incompreendido. Realmente, o disco é denso, soturno às vezes, mas interessantíssimo. E que banho de técnica vocal Ney exibe em todas as faixas!
Essa caixa é mesmo um tesouro, Mauro. Gostei da maioria das tuas resenhas, parabéns.

17 de dezembro de 2008 às 06:16  
Anonymous Anônimo said...

Comprei a caixa porque estava curiosíssima quanto aos dois primeiros. Acertei na mosca: são incríveis, intensos, apaixonantes. O primeiro é de uma coragem...E Barco Negro, quê que é aquilo??!!
Dei uma sapiada em algumas faixas de alguns outros e também estou amando.
Parei tudo para me organizar. Quero ouvir como se deve.

Amei o presente. Ney foi meu Noel.

maria

17 de dezembro de 2008 às 11:18  
Anonymous Anônimo said...

Fui à loja ontem e cobravam R$ 389,90, não dava nem R$ 89,90.

17 de dezembro de 2008 às 11:18  
Anonymous Anônimo said...

Não é o Pescador de Pérolas o título menos raro da caixa ao invés do disco ao vivo de 89?

17 de dezembro de 2008 às 14:49  
Anonymous Anônimo said...

Não dar 89,90. por esse trabalho é sacanagem. O valor cometido pelos lojistas é criminoso, mas menos que 150, não dá.
Um preço justo seria algo em torno disso, vá lá 200 pratas. Venderia bem mais e quem é fã compraria.
Por quase 400 reais cada disco sai por mais ou menos 26 pratas, isso é roubo. Cada disco valendo 15 seria um preço interessante, tipo 225.
Vamos correr atrás desse preço. Mais não compro não. Espero sair avulso.

17 de dezembro de 2008 às 15:28  
Anonymous Anônimo said...

Mauro, parabéns pelos comentários. Só o fato de a caixa trazer o disco de 81, com arranjos do César e do Lincoln, em que Ney trava um duelo de tirar o fôlego com Gal (na época cantando o fino) vale qualquer sacrifício. Sem contar que "Viajante", de Teresa Tinoco, é uma das canções mais belas já compostas na música brasileira. Vale gastar todo o 13º salário para ter essa raridade. Valeu

19 de dezembro de 2008 às 15:08  
Anonymous Anônimo said...

Concordo com o anônimo. "Viajante" - por incrível que pareça nunca lançada por outro(a) artista (se estiver enganado me informem) além de Ney e da compositora - é das melhores da nossa MPB, o que não é pouco não!

19 de dezembro de 2008 às 18:41  

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