12 de dezembro de 2006

Retrô 2006 - O show messiânico do U2 em SP

Se os endiabrados Rolling Stones soltaram os demônios na Praia de Copacabana, em 18 de fevereiro, dias depois o U2 fez brilhar o espírito sagrado de seu rock em dois históricos shows da turnê Vertigo apresentados no Estádio do Morumbi, em São Paulo (SP), em 20 e 21 de fevereiro. Foi a terceira vinda do grupo irlandês ao Brasil e a primeira realmente consagradora. A imagem de Jesus Cristo pregado na cruz - vista no terço deixado por Bono Vox ao microfone, ao fim de 40, o tema inspirado no Salmo 40 e último dos 23 números do roteiro - simbolizou com perfeição o clima messiânico da apresentação. A banda fez sua oração em forma de rock. O público ouviu as súplicas feitas por seu Senhor, Bono, em letras humanitárias. E orou, seja repetindo com devoção o refrão de Pride (In the Name of Love), seja iluminando a platéia com a luz de seus celulares na emocionante One. Para ficar na memória!!

"Para vencer a pobreza, todos temos que trabalhar e agir como um só", pregou Bono (na foto de Guto Costa, em cena durante o show de 20 de fevereiro). Foi um espetáculo de luzes, cores e som como poucas vezes visto no Brasil. Desde o primeiro número, City of Blinding Lights, Bono regeu a platéia escorado na guitarra sempre cortante de The Edge. "Oi, galera! Agora é a nossa vez!", saudou o cantor antes de apresentar Elevation, numa referência ao fato de os Rolling Stones terem eletrizado Copacabana-RJ dois dias antes.

Em sua vez, o U2 fez um show com o tom politizado que norteia sua obra desde o lançamento do disco War, a obra-prima de 1983 que fez o mundo conhecer jóias como Sunday Bloody Sunday (um dos números em que Bono pareceu realmente orar no palco do Morumbi) e New Year's Day (reconhecível aos primeiros acordes do piano tocado por The Edge). O êxtase da platéia diante da visão de seu Messias esquentou até números mais frios como Until the End of the World. Foi em forma de oração que o público cantou sozinho os versos que batizam a balada I Still Haven't Found What I'm Looking for - número a que se seguiu breve momento profano no qual Bono puxou a letra da velha marchinha carnavalesca: "Ai, ai, ai... Está chegando a hora...". Claro que o público completou os versos animada e espontaneamente. Mas o dia não estava raiando e ninguém tinha que ir embora. Ainda. Havia tempo para Bono exorcizar os demônios de sua relação com o pai em Sometimes You Can't Make It on your Own, para protagonizar com Edge o instante folk do show (Stuck in a Moment, com Edge explorando falsetes de sua voz e se acompanhando ao violão) e para assumir em Love and Peace or Else a parte da bateria estrategicamente posicionada na passarela que se estendia do palco rumo à platéia.

No bloco mais politizado de um show que transpirou política, Sunday Bloody Sunday precedeu Bullet the Blue Sky (número teatral em que Bono fechou seus olhos com uma bandana para caminhar cego pela passarela) e Miss Saravejo - uma das orações mais belas, em cujo fim o telão exibiu, em português, trechos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Em Pride (In the Name of Love), Bono citaria os países da América Latina sem esperar forte vaia para a Argentina - efeito de rixas futebolísticas.

Os riffs empolgantes de Where the Streets Have no Name seriam o prenúncio do fim, com One. Mas um bis farto - com Zoo Station, The Fly, Misterious Ways e With or Without You (com direito a fã puxada da platéia para o palco) - prolongou a missa. Um segundo bis, com a elétrica All Because of You, preparou a platéia para a comunhão final com 40. Para o público que lotou o Morumbi ou que viu o show na transmissão ao vivo da Rede Globo, Bono Vox foi um Deus nas noites históricas de 20 e 21 de fevereiro de 2006.

1 Comments:

Anonymous gilda said...

show foi divino mesmo

13 de janeiro de 2010 às 18:09  

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