11 de novembro de 2008

Fina ironia pauta estudo de Tom Zé sobre bossa

Resenha de CD
Título: Estudando a Bossa
- Nordeste Plaza
Artista: Tom Zé
Gravadora: Biscoito Fino
Cotação: * * * *

"Mas tu já viste a bossa nova, a nova onda musical? Que nhenhenhém boçal, hein?!!", perguntam sob base de samba, em tom quase falado, as vozes que fazem o coro de O Céu Desabou, um dos 14 temas de Estudando a Bossa - Nordeste Plaza, álbum com que o tropicalista Tom Zé, em sintonia com a estética antropofágica do movimento que o projetou em 1968, deglute os elementos que sintetizam a estética da Bossa Nova num disco-manifesto pautado pela fina ironia. No ano em que a elite brasileira e a imprensa celebram com excessiva reverência o cinqüentenário da bossa, o velho baiano tira o manto sagrado que cobre o som do banquinho e do violão neste que é seu disco mais inventivo desde que foi (re)descoberto nos anos 90 por David Byrne - aliás, convidado de Outra Insensatez, Poe, faixa em que Zé persegue o estilo melódico dos temas românticos de Tom Jobim (1927 - 1994), principal compositor da bossa sempre nova.

O título do CD remete obviamente ao antológico Estudando o Samba (1976) e ao caótico Estudando o Pagode (2006). Estudando a Bossa não é uma obra-prima como o primeiro, mas tampouco é ruim como o segundo. O álbum não atenta contra a Bossa Nova, mesmo porque Tom Zé sempre explicitou o impacto causado em Irará, sua baiana e interiorana cidade natal, pela revolução estética implantada com o lançamento, em agosto de 1958, da emblemática gravação de Chega de Saudade por João Gilberto. Contudo, ao se apropriar com ironia dos cânones da bossa, cercado de vozes femininas, Tom Zé não deixa de fazer sua crítica ao movimento. Em Brazil, Capital Buenos Aires, deliciosa faixa gravada com Fernanda Takai em que simula a leveza da bossa, o alvo é a valorização do Brasil na cena internacional por conta da bossa. Em Bolero de Platão, cantado com Marina de la Riva, Zé debocha do sentimento de superioridade que os letristas bossa-novistas sentem em relação aos compositores de boleros de versos dilacerados. Em O Amor do Rio, o barquinho de Zé desliza no ritmo suave da bossa em letra que aborda a separação entre Rio de Janeiro e Niterói - e, aí, a ironia maior é ter como vocalista do sambinha Zélia Duncan, boa cantora nascida em... Niterói (RJ).

Estudando a Bossa conta com a feliz adesão de Arnaldo Antunes como letrista dos temas Mulher de Música (gravado por Zé com Fabiana Cozza), Filho do Pato (com a voz de Márcia Castro), Rio Arrepio (Badá-Badi) - sambossa que tem a presença de Mariana Aydar e evoca já no título os vocais à moda de grupos como Os Cariocas - e Barquinho-Herói (com Mônica Salmaso). Repleto de sutis referências ao repertório de João Gilberto, como no delicioso Roquenrol Bim-Bom, tema cantado por Tom Zé com Jussara Silveira, o estudo do inquieto tropicalisra esboça o olhar crítico que faltou entre tantas homenagens aos 50 anos da bossa. Estudando a Bossa vai ser objeto de estudo daqui a... 50 anos.

14 Comments:

Blogger Mauro Ferreira said...

"Mas tu já viste a bossa nova, a nova onda musical? Que nhenhenhém boçal, hein?!!", perguntam sob base de samba, em tom quase falado, as vozes que fazem o coro de O Céu Desabou, uma das 14 temas de Estudando a Bossa - Nordeste Plaza, álbum com que o tropicalista Tom Zé, em sintonia com a estética antropofágica do movimento que o projetou em 1968, deglute os elementos que sintetizam a estética da Bossa Nova num disco-manifesto pautado pela fina ironia. No ano em que a elite brasileira e a imprensa celebram com excessiva reverência o cinqüentenário da bossa, o velho baiano tira o manto sagrado que cobre o som do banquinho e do violão neste que é seu disco mais inventivo desde que foi (re)descoberto nos anos 90 por David Byrne - aliás, convidado de Outra Insensatez, Poe, faixa em que Zé persegue o estilo melódico dos temas românticos de Tom Jobim (1927 - 1994), principal compositor da bossa sempre nova.

O título do CD remete obviamente ao antológico Estudando o Samba (1976) e ao caótico Estudando o Pagode (2006). Estudando a Bossa não é uma obra-prima como o primeiro, mas tampouco é ruim como o segundo. O álbum não atenta contra a Bossa Nova, mesmo porque Tom Zé sempre explicitou o impacto causado em Irará, sua baiana e interiorana cidade natal, pela revolução estética implantada com o lançamento, em agosto de 1958, da emblemática gravação de Chega de Saudade por João Gilberto. Contudo, ao se apropriar com ironia dos cânones da bossa, cercado de vozes femininas, Tom Zé não deixa de fazer sua crítica ao movimento. Em Brazil, Capital Buenos Aires, deliciosa faixa gravada com Fernanda Takai em que simula a leveza da bossa, o alvo é a valorização do Brasil na cena internacional por conta da bossa. Em Bolero de Platão, cantado com Marina de la Riva, Zé debocha do sentimento de superioridade que os letristas bossa-novistas sentem em relação aos compositores de boleros de versos dilacerados. Em O Amor do Rio, o barquinho de Zé desliza no ritmo suave da bossa em letra que aborda a separação entre Rio de Janeiro e Niterói - e, aí, a ironia maior é ter como vocalista do sambinha Zélia Duncan, boa cantora nascida em... Niterói (RJ).

Estudando a Bossa conta com a feliz adesão de Arnaldo Antunes como letrista dos temas Mulher de Música (gravado por Zé com Fabiana Cozza), Filho do Pato (com a voz de Márcia Castro), Rio Arrepio (Badá-Badi) - sambossa que tem a presença de Mariana Aydar e evoca já no título os vocais à moda de grupos como Os Cariocas - e Barquinho-Herói (com Mônica Salmaso). Repleto de sutis referências ao repertório de João Gilberto, como no delicioso Roquenrol Bim-Bom, tema cantado por Tom Zé com Jussara Silveira, o estudo do inquieto tropicalisra esboça o olhar crítico que faltou entre tantas homenagens aos 50 anos da bossa. Estudando a Bossa vai ser objeto de estudo daqui a... 50 anos.

11 de novembro de 2008 às 08:01  
Anonymous Anônimo said...

Ouvi uma vez e me diverti muito.Ironia com uma musicalidade maravilhosa. As mulheres estão demais neste disco.
Mauro,não concordo somente que as homenagens para bossa nova foram excessivas, acho que mais que justo.Acho somente, que talvez,nem todas homenagens acertaram o alvo.

11 de novembro de 2008 às 14:46  
Anonymous Anônimo said...

Márcia Castro e Fabiana Cozza são as melhores cantoras surgidas nessa última safra da MPB. Ela sabem das coisas... São realmente NOVAS .

11 de novembro de 2008 às 15:41  
Blogger Unknown said...

massa o blog Mauro, o meu também fala sobre o mercado fonográfico, estratégias e tudo isso que funciona no backstage do entretenimento.
www.carpatia.wordpress.com

11 de novembro de 2008 às 15:57  
Anonymous Anônimo said...

Eita, que timaço de cantoras! Só a Jussara, a Mõnica e a Fabiana já valem por seis. Só faltaram Ná Ozzetti, Teresa Cristina e Rita Ribeiro.

11 de novembro de 2008 às 18:23  
Anonymous Anônimo said...

Boa sacada do baiano e logo no ano que elite brasileira e a imprensa celebram com exaustiva reverência o cinqüentenário da bossa nova

Me animei pois esses convidados dão um show a parte, um charme a mais!



PS > Queria (um dia) produzir um album com Tom Zé e Jorge Mautner juntos.

11 de novembro de 2008 às 18:31  
Anonymous Anônimo said...

Diogo ! disse...
Boa sacada do PS > Queria (um dia) produzir um album com Tom Zé e Jorge Mautner juntos.

PODE SER.... PELO MENOS OS DOIS SÃO DE PAZ.... GENIOS, LOUCOS, MAS DE PAZ...

MAS HÁ UM RISCO CRUEL : OU O DISCO SERIA THE BEST OU A BOSTA.
COM OS DOIS JUNTOS NÃO HAVERIA MEIO TERMO. MAS É UMA COIS PARA SE PENSAR

11 de novembro de 2008 às 19:27  
Anonymous Anônimo said...

ouvi dizer que a patricia marx também marcou presença neste álbum, assim como em estudando o pagode. alguém pode me informar em qual faixa ela participa?

11 de novembro de 2008 às 22:21  
Blogger trrr said...

Mauro, gostei da tua crítica mas duas coisas me incomodaram.

1 - Acho que tens de dar mérito ao Tom Zé por convidar alguns dos maiores talentos da música brasileira atual para cantarem no disco, talentos nada óbvios do perfil de Roberta Sá, por exemplo. Andreia Dias teve uma performance exemplar e Marcia Castro idem. A própria Anelis Assumpção fez muito bonito, e Badi Assad registrou belos vocais.

2 - Acho que depende um pouco da opinião de cada um também, mas me choca o fato de não gostares do Estudando o Pagode. Sou leitor do Notas Musicais desde sua estréia e sei que tens um gosto refinado: tente escutar o disco lendo as letras, e várias vezes. É de uma genialidade absurda e só tem a adicionar na música brasileira. :)

Acho que é isso. Salve Tom Zé!

11 de novembro de 2008 às 22:52  
Anonymous Anônimo said...

o show no Circo para lançamento do disco foi demais. Tenho ouvido muito o disco, e uma frase de Bada-badi nao me sai da cabeça: "ainda nao me refiz, de ter perdido a Elis"

11 de novembro de 2008 às 23:36  
Blogger Breno Alves said...

Gostaria de entender Tom Zé e sua verborragia musical e estilística e o culto que as pessoas e a crítica musical fazem a ele.É um artista difícil, excessivamente errático e anárquico pros meus ouvidos! Em música, penso eu, menos é mais! Vale pelas cantoras, bem mais palatáveis e interessantes que ele, e só!

12 de novembro de 2008 às 00:12  
Blogger Betomenezes said...

Estudando o pagode não é ruim, acho melhor do que esse novo.

12 de novembro de 2008 às 14:46  
Anonymous Anônimo said...

Uma criatura que se aproveita de algo,que a certo modo repele,em pleno auge deste,não merece de mim nem piedade que dirá a cara pachorra.Ademais não conheço criatura psicologicamente mais egocêntrica que Tom Zé,alguém que acha que pode colocar-se em meio a paradigmas verticais - que inatos sustentam necessariamente as coisas,não pode ter senão um ego anabolizado - pior que injeta-se de nada,injeta-se doente do mesmo vômito desse igual vazio que o rebuliça.
Acho que o que faz justamente falta a ele (em níveis comprometedores - doses cavalares rs) é esta beleza vadia que contém ,que permeia QUASE todas as coisas que ele "estuda".A feiúra,o escatológico,os rejeitos o perseguem e não porque ele saiba dominar tais paralelos pródigos e tenha nestes, trunfos contra estereótipos,mas porque ele nunca conseguiu alcançar os tais paradigmas, e não há quem me convença que ele viva satisfeito no "santo reino" dos excluídos - que tudo vêem rs.
"Isso é bossa nova isso é muito natural",o que ele não sabe nem sequer pressente é que no mundo linear - onde existem pessoas sujeitas á, ainda batem corações.Entre Tons eu fico uma e todas as vezes mais, com o meu amado maestro, de pássaros e beleza, com angústias, sem paranóias,com reservas,sem achaques:irrequieto traquilo, simples e apaixonante,aliás tal equação simples não chegaria a um pobre consenso mendigado, no quadro negro vazio de Tom Zé.
Tom Zé eu deixo Freud (re)estudar você através do que já FOI DITO (irônico hein?)
A propósito Mauro sua crítica foi mal feita, sobretudo mal resolvida (muita alusão inútil pouca substância:ora ora! rss) desculpe,mas no caso de Tom Zé se nem o tal se compreende como é que você vai o fazer ("não é bom como o primeiro mas não é ruím como o segundo"...rsss)
Como o REPETE Abujamra "Ai de mim,ai de mim"...

"Centópeia".

12 de novembro de 2008 às 19:23  
Anonymous Anônimo said...

Centopéia,
Simpatizo com várias de suas críticas, mas acho que querer comparar Tom Zé com Tom Jobim foi demais. Aí qualquer um vira um lixo, até eu e você.

25 de maio de 2010 às 22:42  

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