1 de março de 2009

Moraes reconta mal 40 anos de história musical

Resenha de CD / DVD
Título: A História dos
Novos Baianos
e Outros Versos
Artista: Moraes
Moreira
Gravadora: Biscoito
Fino
Cotação: * *

Moraes Moreira completa em 2009 quatro décadas de carreira, iniciada em 1969 como integrante do já lendário grupo Novos Baianos. É justo, pois, que o compositor festeje essa data com projeto retrospectivo editado em DVD e CD ao vivo - até porque o único DVD de Moreira disponível até então no mercado fonográfico era um Acústico MTV transposto do VHS lançado em 1995. Infelizmente, a gravação captada em show feito em junho de 2008 na Feira de São Cristovão - tradicional e festeiro reduto de nordestinos radicados no Rio de Janeiro (RJ) - flagra o artista em momento ruim. Moreira está cantando mal. Sua voz soa fanhosa, por vezes, com emissão abaixo do padrão habitual do artista, que, mesmo sem nunca ter sido um majestoso cantor, sempre deu conta do recado ao interpretar suas músicas. Para piorar, a captação de imagens é protocolar, com movimentos lineares que pouco exploram o cenário de bolas e globos coloridos que remetem aos festejos juninos. Esses fatores fizeram com que o CD e DVD A História dos Novos Baianos e Outros Versos - gerados a partir do livro homônimo de 2007, escrito por Moreira com inspiração na literatura de cordel - sejam pálida amostra da obra vivaz do subestimado compositor, ainda não reconhecido na medida da qualidade de sua obra autoral, (ainda interessante, a julgar pelo ignorado CD De Repente, editado em 2005). É fato que as duas inéditas do roteiro, Oi e Spok Frevo Spok, também não se impõem dentro do vasto repertório do artista. A primeira é canção que busca nos versos uma sintonia com a modernidade hi-tech. "Essa é para tocar no seu celular", anuncia Moraes, antes de cantar Oi, cuja letra fala da comunicação entre apaixonados via telefonia móvel. A segunda - parceria de Moraes com o guitarrista Fernando Caneca - é mais interessante por celebrar o frevo e o maestro Spok, de Pernambuco. Aliás, o ritmo pernambucano dá o tom do bloco final do show dirigido por João Falcão. É o momento em que Moreira recorda hits como Festa do Interior e Bloco do Prazer, frevos lançados por Gal Costa com grande repercussão popular em 1981 e em 1982, respectivamente, na sua fase tropical.

Com a participação de Davi Moraes, que canta e toca sua guitarra em músicas como Colégio de Aplicação, Moreira reconta sua história a partir da vivência hippie no grupo Novos Baianos, desmistificada em cena ("Nenhum novo baiano tinha talento para administrar a vida prática", admite Moreira, acrescentando que as dificuldades econômicas o impulsionaram a deixar o grupo para seguir carreira solo). Nesta primeira parte, o compositor intercala as músicas com leituras de trechos do livro que emprestou seu título ao CD e DVD ora lançados pela Biscoito Fino. Preta Pretinha - referendada pelo forte coro popular - ressurge com progressiva pegada agalopada de pique carnavalesco. Um Bilhete para Didi, solo de Davi, mostra que o filho de Moreira também é herdeiro da maestria do tio Pepeu Gomes ao tocar sua guitarra suingante. De Pepeu, a propósito, Moreira revive mais tarde Eu Também Quero Beijar, hit das FMs nos anos 80. Entre reverências a Luiz Gonzaga (1913 - 1989), cujo baião Respeita Januário é emendado em medley com o Forró do ABC, o compositor reconta sua história solo através de sucessos como o samba Lá Vem o Brasil Descendo a Ladeira (1979), a balada Sintonia - hit radiofônico dos anos 80 recriado com toque nordestino - e a canção Meninas do Brasil, certamente incluída por conta da escolha da música para batizar o show que uniu Jussara Silveira, Rita Ribeiro e Teresa Cristina. Aliás, a interpretação atual do autor é tão desbotada face ao registro das cantoras que é exemplo perfeito do caráter insosso do DVD, em cujos extras, simpáticos, Moreira circula pela Feira de São Cristovão. O artista visita a barraca da Chiquita (feirante que em 2009 contabiliza 30 anos no local), tira fotos com fãs, come tapioca e aprecia as estátuas de Lampião (1897 - 1938) e Maria Bonita (1911 - 1938). Pena que, em cima do palco, comandando a massa, Moraes Moreira não tenha se mostrado tão sedutor como de costume. Seus 40 anos de coerente história mereciam registro mais refinado - à altura da importância desse compositor na MPB.

12 Comments:

Blogger Mauro Ferreira said...

Moraes Moreira completa em 2009 quatro décadas de carreira, iniciada em 1969 como integrante do já lendário grupo Novos Baianos. É justo, pois, que o compositor festeje essa data com projeto retrospectivo editado em DVD e CD ao vivo - até porque o único DVD de Moreira disponível até então no mercado fonográfico era um Acústico MTV transposto do VHS lançado em 1995. Infelizmente, a gravação captada em show feito em junho de 2008 na Feira de São Cristovão - tradicional e festeiro reduto de nordestinos radicados no Rio de Janeiro (RJ) - flagra o artista em momento ruim. Moreira está cantando mal. Sua voz soa fanhosa, por vezes, com emissão abaixo do padrão habitual do artista, que, mesmo sem nunca ter sido um majestoso cantor, sempre deu conta do recado ao interpretar suas músicas. Para piorar, a captação de imagens é protocolar, com movimentos lineares que pouco exploram o cenário de bolas e globos coloridos que remetem aos festejos juninos. Esses fatores fizeram com que o CD e DVD A História dos Novos Baianos e Outros Versos - gerados a partir do livro homônimo de 2007, escrito por Moreira com inspiração na literatura de cordel - sejam pálida amostra da obra vivaz do subestimado compositor, ainda não reconhecido na medida da qualidade de sua obra autoral, (ainda interessante, a julgar pelo ignorado CD De Repente, editado em 2005). É fato que as duas inéditas do roteiro, Oi e Spok Frevo Spok, também não se impõem dentro do vasto repertório do artista. A primeira é canção que busca nos versos uma sintonia com a modernidade hi-tech. "Essa é para tocar no seu celular", anuncia Moraes, antes de cantar Oi, cuja letra fala da comunicação entre apaixonados via telefonia móvel. A segunda - parceria de Moraes com o guitarrista Fernando Caneca - é mais interessante por celebrar o frevo e o maestro Spok, de Pernambuco. Aliás, o ritmo pernambucano dá o tom do bloco final do show dirigido por João Falcão. É o momento em que Moreira recorda hits como Festa do Interior e Bloco do Prazer, frevos lançados por Gal Costa com grande repercussão popular em 1981 e em 1982, respectivamente, na sua fase tropical.

Com a participação de Davi Moraes, que canta e toca sua guitarra em músicas como Colégio de Aplicação, Moreira reconta sua história a partir da vivência hippie no grupo Novos Baianos, desmistificada em cena ("Nenhum novo baiano tinha talento para administrar a vida prática", admite Moreira, acrescentando que as dificuldades econômicas o impulsionaram a deixar o grupo para seguir carreira solo). Nesta primeira parte, o compositor intercala as músicas com leituras de trechos do livro que emprestou seu título ao CD e DVD ora lançados pela Biscoito Fino. Preta Pretinha - referendada pelo forte coro popular - ressurge com progressiva pegada agalopada de pique carnavalesco. Um Bilhete para Didi, solo de Davi, mostra que o filho de Moreira também é herdeiro da maestria do tio Pepeu Gomes ao tocar sua guitarra suingante. De Pepeu, a propósito, Moreira revive mais tarde Eu Também Quero Beijar, hit das FMs nos anos 80. Entre reverências a Luiz Gonzaga (1913 - 1989), cujo baião Respeita Januário é emendado em medley com o Forró do ABC, o compositor reconta sua história solo através de sucessos como o samba Lá Vem o Brasil Descendo a Ladeira (1979), a balada Sintonia - hit radiofônico dos anos 80 recriado com toque nordestino - e a canção Meninas do Brasil, certamente incluída por conta da escolha da música para batizar o show que uniu Jussara Silveira, Rita Ribeiro e Teresa Cristina. Aliás, a interpretação atual do autor é tão desbotada face ao registro das cantoras que é exemplo perfeito do caráter insosso do DVD, em cujos extras, simpáticos, Moreira circula pela Feira de São Cristovão. O artista visita a barraca da Chiquita (feirante que em 2009 contabiliza 30 anos no local), tira fotos com fãs, come tapioca e aprecia as estátuas de Lampião (1897 - 1938) e Maria Bonita (1911 - 1938). Pena que, em cima do palco, comandando a massa, Moraes Moreira não tenha se mostrado tão sedutor como de costume. Seus 40 anos de coerente história mereciam registro mais refinado - à altura da importância desse compositor na MPB.

1 de março de 2009 às 11:15  
Anonymous Anônimo said...

Por essa eu não esperava, Mauro. Espero que estejas errado. Será ?

1 de março de 2009 às 12:28  
Anonymous Anônimo said...

"Nenhum novo baiano tinha talento para admnistrar a vida prática."

No meu modo de ver as coisas, essa frase não desmitifica, ao contrário, mitifica!
Pra mim foram a melhor banda de rock'n'mpb do Brasil, som atemporal.

Jose Henrique

1 de março de 2009 às 17:37  
Anonymous Anônimo said...

Zé Henrique sempre cultivando nos roqueiros brazucas a linha "quanto menos bundão melhor"...

Pois se, quando Mauro noticiava as brigas que corroeram o Ira! em sua fase final, o Zé disse "se banda de rock termina brigando, tá tudo em casa. Pior é se arrastar como os Titãs 'tão fazendo"...

Mas até que eu concordo quanto aos NB. O "hippismo" em que viveram no início dos 70 teve muito charme, sem dúvida. Colaborou para um clima "garageiro" de "Acabou Chorare", "Novos Baianos F.C."... "Bilhete pra Didi" é dos melhores solos de guitarra da MPB.

Ah, Zé: sabia que eu lembrei de ti nas primeiras horas do 01.01.2009? Pena que o agente catalisador da lembrança não tenha sido bacana: Ivete Sangalo "assassinando" "Não é Proibido", num show de fim de ano...

1 de março de 2009 às 20:04  
Anonymous Anônimo said...

Vi o show pelo canal Brasil. Acho que, infelizmente até, a crítica de Mauro está perfeita. Faltou mais vontade talvez. Embora a boa música de Moraes supere tudo e faça do produto algo quase obrigatório.
Lamento de verdade mesmo a inédita Oi. Artistas com a história de Moraes deviam se negar a fazer tal coisa. Considerando que a Oi é uma das grandes do setor, a música é na verdade uma grande propaganda. Ruim. E que devia estar no espaço publicitário e não no cd ou no DVD.
Deve-se mesmo valorizar a vinda de um DVD de Moraes. O Acústico MTV é um grande show. Porém a gravadora foi desrespeitosa com o cliente e lançou o DVD sem nenhum trabalho no som. Acho incrível como o som do DVD é ruim, enquanto que o cd tem um tratatamento de som bem interessante.

1 de março de 2009 às 20:26  
Anonymous Anônimo said...

Que pena.

Gosto tanto do Moraes Moreira. Estava ansiando por esse DVD.

Apesar da crítica do Mauro, acho que vou comprá-lo mesmo assim.

Moraes Moreira, Dominguinhos, Paulinho Pedra Azul são alguns dos compositores subestimados no Brasil. Vale a pena acompanhar sempre o trabalho deles.

abração,
Denilson

2 de março de 2009 às 10:25  
Anonymous Anônimo said...

Mano Freire disse..

Já escrevi aqui e repito: Moraes - um dos poucos melhores da Bahia - foi enterrado pelos baianos, vítima da nojenteza dessa turma que taí faturando alto, mandando no mercado no esquema máfia do dendê que vai de Ivete a Bel, os malas da Bahia. Se a turma das gravadores tivesse respeito, até faria um soongbook ( pena que Chediak não está maos aqui), com a obra de Moraes, reunindo gente de peso, claro, sem Ivete, Mercury e nem Bel e cia... Cad~e bethabi,a Galç, Simone, Elba... as que já se apoderaram de sua canções??? Moaes, pode, tem bagagem, talento, história. O resto é fuá.

2 de março de 2009 às 14:13  
Anonymous Anônimo said...

Grande Felipe, fico lisonjeado que se lembre dos meus pitacos por aqui. Sinal que, mesmo várias vezes não concordando, leva em conta os mesmos.

Ivetão é realmente muito fraquinha, mas seu bom humor lhe salva.

PS: Tira as aspas do(tão fazendo).
É de domínio púbico, faz tempooooo.

"Nem andando, nem voando. Só sambando" Novos Baianos

Abraço
Jose Henrique

2 de março de 2009 às 14:21  
Anonymous Anônimo said...

Mano Freire, o Moraes paga o preço de não querer(pra quem é de verdade, não é nem questão de não querer, é de não poder) abrir mão de seus valores.
Como poderia um legítimo novo baiano cantar num trio com as horrendas cordas?
Há mais de 10 anos ele passa carnaval aqui em PE.
Soube por amigos que esse ano os trios sem cordas bateram record lá na Bahia.
Acho que é uma tendência irreversível, como diria o malandro:
"Pode encher sua piscina, mas não esvazia minha bacia"

PS: O tempo sempre julga e Moraes vai voltar por cima lá na Bahia.
O tempo é rei, já dizia o dono do camarote.

Jose Henrique

2 de março de 2009 às 14:48  
Blogger Márcio said...

Moraes Moreira tocou este ano em Brasília, nas noites de segunda e terça de carnaval. Não sei se durante o dia se apresentou em outros lugares, mas essa "ponte-aérea" não é incomum. Armandinho, do Trio Elétrico de Armandinho, Dodô e Osmar, já a fez certa vez, tocando de dia em Brasília e à noite em Salvador durante todo um carnaval. Já havia notado o problema com a voz de Moraes e torço para que haja alguma solução, pois é horrível quando ele, por exemplo, não consegue alcançar alguns agudos que antes tirava de letra. Logicamente o lugar de Moraes na música brasileira já está garantido por sua participação nos Novos Baianos e sua brilhante carreira solo. Seu papel como compositor ainda é subestimado e merece maior atenção. Concordo com a sugestão do songbook aqui feita. Quanto ao carnaval e aos trios elétrico, não sou partidário da dicotomia "trio com corda é ruim e trio sem corda é bom". Para mim, há espaço para ambos. Resumir tudo às cordas é recorrer a um simplismo pouco esclarecedor. Afinal, os blocos afro têm corda e ninguém lhes tira a beleza ou a legitimidade. Quanto à expressão "Máfia do Dendê", que o jornalista Cláudio Tognolli adorava usar de modo espalhafatoso, bem melhor é uma frase do próprio Moraes: "Mancha de dendê não sai!".

2 de março de 2009 às 18:48  
Anonymous Anônimo said...

Também lamento saber que o registro não está a altura do grande Moraes. Mas entrei aqui só pra dividir uma curiosodade: não é que a Biscoito Fino ainda divulgou em seu site a resenha do Mauro sobre os produtos, mesmo não sendo nada elogiosas? Não entendi...

http://www.biscoitofino.com.br/bf/not_namidia_cada.php?id=987

Até mais,
Anderson Falcão.
Brasília - DF

Zé, não me esqueci de você não. Te encontro na sua caixinha partcular, em vez dessa. Logo. Abraço pra você.

2 de março de 2009 às 19:13  
Anonymous Anônimo said...

Ouvi/vi hoje o DVD. Mauro tem CERTA razão sim. Mas talvez por ser Moraes Moreira com sua bagagem e história depois da 2º ou 3º música é "tudo lindo" - como diria um conterrâneo seu. COMPREM, VEJAM, OUÇAM QUE VALE A PENA.

4 de março de 2009 às 18:43  

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