Livro perfila Ivone em pioneira abertura de alas
Resenha de Livro
Título: Nasci para Sonhar e Cantar
Dona Ivone Lara: a Mulher no Samba
Autoria: Mila Burns
Editora: Record
Cotação: * * * 1/2
Mais do que uma biografia de Ivone Lara, Nasci para Sonhar e Cantar esboça sedutor perfil de cunho sociológico desta pioneira artista que abriu alas no samba para as mulheres compositoras do gênero. Adaptado de uma tese acadêmica defendida em 2006 pela autora Mila Burns (jornalista com Mestrado em Antropologia Social), o livro reconstitui os passos de Ivone Lara à luz dos (pre)conceitos machistas que guiavam a sociedade na época em que a compositora iniciante teve que recorrer a um primo influente nos redutos do samba e da Serrinha - Antonio dos Santos, o futuro Mestre Fuleiro (1911 - 1997) - para que suas músicas fossem ouvidas. Fuleiro mostrava os sambas dela como sendo de autoria dele, com aval de Ivone, que se contentava em ver sua criação ser bem recebida pelos bambas. Burns mostra em texto fluente como Ivone - orfã de mãe aos 12 anos, idade em que compôs seu primeiro partido alto, Tiê - soube traçar seus caminhos e se impor como compositora de assinatura original. Em 1947, ano emblemático na vida da artista, ela casa, se forma em assistência social (profissão que lhe garantiu o sustento até a aposentadoria, em 1977) e passa a integrar oficialmente a ala de compositores da recém-criada escola de samba Império Serrano, auxiliada pelo prestígio de ser nora de um dos fundadores da agremiação carioca, criada a partir de dissidência na seminal Prazer da Serrinha. Em 1965, ajudada pelo acaso e por inspiração que considera intuitiva, Ivone abriria mais alas no samba e se tornaria a primeira mulher a assinar um samba-enredo oficial, Os Cinco Bailes da História do Rio, concluído por ela no momento em que percebeu, ao visitar os autores Silas de Oliveira e Bacalhau, que ambos - já bêbados... - não conseguiam completar o tema que se transformaria em obra-prima do gênero.
Distante da linguagem acadêmica que a originou, a narrativa de Mila Burns não chega a ter cunho biográfico porque a reconstituição da vida de Ivone é feita de forma superficial - sobretudo depois que a artista, já aposentada como assistente social e reconhecida como compositora, entrar para valer no mundo artístico, gravando discos e fazendo shows. Uma vida inimaginável para a moça que, desafiando as regras de sua sociedade, primeiro tratou de se formar para garantir um emprego e depois, então, começou a pensar em casamento - o que aconteceria quando Ivone já contava 26 anos, idade tardia para os tempos em que as moças de família estavam destinadas ao lar. O livro mostra também como Ivone recebeu educação musical formal no internato em que estudou após a morte dos pais. O confinamento integral na escola abriu os olhos de Ivone para as muitas possibilidades que o mundo poderia lhe oferecer. E, sem pressa, mas, dona de seu nariz, ciente de que o caminho era mesmo dela, Ivone Lara foi se aproximando cada vez mais do samba - sem nunca abandonar o emprego que lhe garantia renda fixa ao fim do mês - e pavimentou estrada luminosa num reduto em que às mulheres até então eram destinados somente os papéis de ouvinte ou intérprete. Ivona Lara se impôs como criadora de samba numa época refratária às atitudes femininas e feministas, abrindo alas para sucessoras como Teresa Cristina. É esse matiz que dá o tom sociológico deste (bem-vindo...) livro de Mila Burns.
Título: Nasci para Sonhar e Cantar
Dona Ivone Lara: a Mulher no Samba
Autoria: Mila Burns
Editora: Record
Cotação: * * * 1/2
Mais do que uma biografia de Ivone Lara, Nasci para Sonhar e Cantar esboça sedutor perfil de cunho sociológico desta pioneira artista que abriu alas no samba para as mulheres compositoras do gênero. Adaptado de uma tese acadêmica defendida em 2006 pela autora Mila Burns (jornalista com Mestrado em Antropologia Social), o livro reconstitui os passos de Ivone Lara à luz dos (pre)conceitos machistas que guiavam a sociedade na época em que a compositora iniciante teve que recorrer a um primo influente nos redutos do samba e da Serrinha - Antonio dos Santos, o futuro Mestre Fuleiro (1911 - 1997) - para que suas músicas fossem ouvidas. Fuleiro mostrava os sambas dela como sendo de autoria dele, com aval de Ivone, que se contentava em ver sua criação ser bem recebida pelos bambas. Burns mostra em texto fluente como Ivone - orfã de mãe aos 12 anos, idade em que compôs seu primeiro partido alto, Tiê - soube traçar seus caminhos e se impor como compositora de assinatura original. Em 1947, ano emblemático na vida da artista, ela casa, se forma em assistência social (profissão que lhe garantiu o sustento até a aposentadoria, em 1977) e passa a integrar oficialmente a ala de compositores da recém-criada escola de samba Império Serrano, auxiliada pelo prestígio de ser nora de um dos fundadores da agremiação carioca, criada a partir de dissidência na seminal Prazer da Serrinha. Em 1965, ajudada pelo acaso e por inspiração que considera intuitiva, Ivone abriria mais alas no samba e se tornaria a primeira mulher a assinar um samba-enredo oficial, Os Cinco Bailes da História do Rio, concluído por ela no momento em que percebeu, ao visitar os autores Silas de Oliveira e Bacalhau, que ambos - já bêbados... - não conseguiam completar o tema que se transformaria em obra-prima do gênero.
Distante da linguagem acadêmica que a originou, a narrativa de Mila Burns não chega a ter cunho biográfico porque a reconstituição da vida de Ivone é feita de forma superficial - sobretudo depois que a artista, já aposentada como assistente social e reconhecida como compositora, entrar para valer no mundo artístico, gravando discos e fazendo shows. Uma vida inimaginável para a moça que, desafiando as regras de sua sociedade, primeiro tratou de se formar para garantir um emprego e depois, então, começou a pensar em casamento - o que aconteceria quando Ivone já contava 26 anos, idade tardia para os tempos em que as moças de família estavam destinadas ao lar. O livro mostra também como Ivone recebeu educação musical formal no internato em que estudou após a morte dos pais. O confinamento integral na escola abriu os olhos de Ivone para as muitas possibilidades que o mundo poderia lhe oferecer. E, sem pressa, mas, dona de seu nariz, ciente de que o caminho era mesmo dela, Ivone Lara foi se aproximando cada vez mais do samba - sem nunca abandonar o emprego que lhe garantia renda fixa ao fim do mês - e pavimentou estrada luminosa num reduto em que às mulheres até então eram destinados somente os papéis de ouvinte ou intérprete. Ivona Lara se impôs como criadora de samba numa época refratária às atitudes femininas e feministas, abrindo alas para sucessoras como Teresa Cristina. É esse matiz que dá o tom sociológico deste (bem-vindo...) livro de Mila Burns.
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Mais do que uma biografia de Ivone Lara, Nasci para Sonhar e Cantar esboça sedutor perfil de cunho sociológico desta pioneira artista que abriu alas no samba para as mulheres compositoras do gênero. Adaptado de uma tese acadêmica defendida em 2006 pela autora Mila Burns (jornalista com Mestrado em Antropologia Social), o livro reconstitui os passos de Ivone Lara à luz dos (pre)conceitos machistas que guiavam a sociedade na época em que a compositora iniciante teve que recorrer a um primo influente nos redutos do samba e da Serrinha - Antonio dos Santos, o futuro Mestre Fuleiro (1911 - 1997) - para que suas músicas fossem ouvidas. Fuleiro mostrava os sambas dela como sendo de autoria dele, com aval de Ivone, que se contentava em ver sua criação ser bem recebida pelos bambas. Burns mostra em texto fluente como Ivone - orfã de mãe aos 12 anos, idade em que compôs seu primeiro partido alto, Tiê - soube traçar seus caminhos e se impor como compositora de assinatura original. Em 1947, ano emblemático na vida da artista, ela casa, se forma em assistência social (profissão que lhe garantiu o sustento até a aposentadoria, em 1977) e passa a integrar oficialmente a ala de compositores da recém-criada escola de samba Império Serrano, auxiliada pelo prestígio de ser nora de um dos fundadores da agremiação carioca, criada a partir de dissidência na seminal Prazer da Serrinha. Em 1965, ajudada pelo acaso e por inspiração que considera intuitiva, Ivone abriria mais alas no samba e se tornaria a primeira mulher a assinar um samba-enredo oficial, Os Cinco Bailes da História do Rio, concluído por ela no momento em que percebeu, ao visitar os autores Silas de Oliveira e Bacalhau, que ambos - já bêbados... - não conseguiam completar o tema que se transformaria em obra-prima do gênero.
Distante da linguagem acadêmica que a originou, a narrativa de Mila Burns não chega a ter cunho biográfico porque a reconstituição da vida de Ivone é feita de forma superficial - sobretudo depois que a artista, já aposentada como assistente social e reconhecida como compositora, entrar para valer no mundo artístico, gravando discos e fazendo shows. Uma vida inimaginável para a moça que, desafiando as regras de sua sociedade, primeiro tratou de se formar para garantir um emprego e depois, então, começou a pensar em casamento - o que aconteceria quando Ivone já contava 26 anos, idade tardia para os tempos em que as moças de família estavam destinadas ao lar. O livro mostra também como Ivone recebeu educação musical formal no internato em que estudou após a morte dos pais. O confinamento integral na escola abriu os olhos de Ivone para as muitas possibilidades que o mundo poderia lhe oferecer. E, sem pressa, mas, dona de seu nariz, ciente de que o caminho era mesmo dela, Ivone Lara foi se aproximando cada vez mais do samba - sem nunca abandonar o emprego que lhe garantia renda fixa ao fim do mês - e pavimentou estrada luminosa num reduto em que às mulheres até então eram destinados somente os papéis de ouvinte ou intérprete. Ivona Lara se impôs como criadora de samba numa época refratária às atitudes femininas e feministas, abrindo alas para sucessoras como Teresa Cristina. É esse matiz que dá o tom sociológico deste (bem-vindo...) livro de Mila Burns.
A Tereza Cristina é mesmo o mais belo, e certo, exemplo de sucessora.
Compõe e canta lindamente.
PS: Realmente, é um universo bem machista. Mais uma qualidade pra Dona Ivone, pioneira.
Jose Henrique
Viva Dona Ivone Lara. Sempre...
abração,
Denilson
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