27 de novembro de 2006

Pesquisa é ponto g de inventário sexual da MPB

Resenha de livro
Título: História Sexual da MPB
Autor: Rodrigo Faour
Editora: Record
Cotação: * * *


Depois de biografia chapa branca do ídolo Cauby Peixoto, em que omitiu diplomaticamente até mesmo a data de nascimento do artista perfilado, o jornalista e pesquisador Rodrigo Faour dá sua primeira real contribuição à bibliografia musical brasileira com este inventário afetivo e sexual da canção nacional. Em quase 600 páginas, o autor carioca monta o painel evolutivo do cancioneiro em relação às abordagens de amor e sexo na MPB.

Ponto g do livro, a monumental pesquisa de Faour sobre o tema o redime do texto eventualmente gorduroso e de alguns bobocas comentários exclamativos feitos após a publicação de trechos das letras. O inventário começa ainda no século 18 - com a análise de letras de Domingos Caldas Barbosa (1740 - 1800), compositor de modinhas e lundus de grande popularidade em sua época - e chega aos dias atuais com a radiografia das letras (erotizadas) dos funks.

Faour mostra como a mulher - geralmente retratada nas músicas sob ótica machista e negativa até meados dos anos 50 - somente teve suavizado seu perfil a partir do advento da Bossa Nova, com a projeção de letristas como Ronaldo Bôscoli. O comportamento patriarcal era padrão tão enraizado na sociedade que até mesmo compositores de cabeça em tese mais arejada, como Vinicius de Moraes, demoraram para se livrar desse jugo machista em seus versos. Joyce - uma das entrevistadas do livro - não foge à luta feminista na canção brasileira (da qual foi pioneira) e, sem rancor e com razão, cunha como machista boa parte da obra do Poetinha.

Ao relatar a história sexual da música brasileira, Faour lembra que nem mesmo a moderninha Jovem Guarda, dona de suposta rebeldia, deixou de ver a mulher como um mero objeto do prazer masculino, ainda que uma ou outra garota papo firme, como Wanderléa, já ensaiasse um discurso autônomo em músicas como Prova de Fogo. A rigor, a postura verdadeiramente libertária somente chegaria nos anos 70 - quando onda de erotismo levou a música brasileira por caminhos nunca antes navegados de forma tão explícita - e desabrocharia na década de 80 quando o pop rock deu um novo colorido à cena pop com visão desencanada do sexo.

Entre depoimentos de artistas como Chico Buarque (mestre na escrita de letras sob ótica feminina) e Simone, que contesta qualquer ação premeditada na gravação de sucessivas músicas sensuais entre o fim dos anos 70 e início dos 80, em discurso bem parecido com o de Maria Bethânia, Faour reproduz letras que vão sinalizando uma (gradual) mudança de mentalidade da sociedade.

Sem preconceitos, o autor ensaia defesa do funk - cujas letras mais sexistas, sobretudo as de Tati Quebra-Barraco, vem sofrendo patrulhamento similar ao ocorrido com o maxixe no começo do século 20 - e historia as letras de duplo sentido, matéria-prima de muitos forrós sacanas. Há ainda capítulo dedicado às canções de amor homossexual, que, após anos de invisibilidade e de versos apenas sugeridos (a exemplo de algumas músicas de Johnny Alf), começaram a sair do armário a partir dos anos 70, sobretudo em discos de Ângela RoRo (primeira e única cantora a assumir sem subterfúgios sua homossexualidade) e, claro, de Ney Matogrosso.

Por conta da pesquisa ampla, geral e irrestrita, História Sexual da MPB - A Evolução do Amor e do Sexo na Canção Brasileira é livro que ajuda a compreender os mecanismos da sociedade através da análise da música produzida em um país tão libertino quanto hipócrita. E, por isso mesmo, sempre tão sexual.

8 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Mauro, o que você chama de "texto eventualmente gorduroso e de alguns bobos comentários exclamativos" é justamente a pimenta do texto, a graça. Acho que não é por aí (como você entende). Li o livro e adorei, que pra mim já é essencial para qualquer pessoa interessada em mpb.

Bruno/SP

27 de novembro de 2006 às 12:43  
Anonymous Anônimo said...

Comparar o funk com os maxixes do começo do século é, no minímo, sacanagem. A vulgaridade de hoje só tende a piorar por causa desses comentários condescendentes.

27 de novembro de 2006 às 14:36  
Anonymous Anônimo said...

Li o livro - terminei na última sexta. Não gostei. Achei puro oportunismo, e outra, tem coisas que não entraram, e muitas outras que não tem nada a ver.

nota 05.

Faour é um ótimo remasterizador de discos de bethania. e só.

27 de novembro de 2006 às 18:47  
Anonymous Anônimo said...

fiquei curioso. vou atrás. tks, mauro.

27 de novembro de 2006 às 19:57  
Anonymous Anônimo said...

Também li e não gostei. Oportunista, apelativo, enchação de linguiça, adiposo. Poderia ter gasto os meus ause 60 reais de melhor maneira. E sobre Travessia, o livro sobre Milton? Ninguém vai dizer nada?

29 de novembro de 2006 às 10:53  
Blogger Mauro Ferreira said...

Anônimo, assim que acabei de ler o livro do Faour, comecei a ler a biografia do Milton. Aguarde uma resenha.

29 de novembro de 2006 às 12:36  
Anonymous Anônimo said...

Mano Freire disse

Engraçado é que esse pessoal mete a ripa e não eleva uma boa discussão. Nem sequer dão propostas sobre o que faltou, se tem algum erro de informação, como seria melhor.. ajudem, mostrem uma luz no fim do túnel ao autores. De fato ainda nã li nenhum e mesmo depois de fazer isso, não sairia batendo à toa até porque não tenho doutorado em porra nenhuma. A galera de cima tem???

30 de novembro de 2006 às 13:04  
Blogger Mauro Ferreira said...

É isso aí, Mano. Os livros podem ter problemas, mas têm também seus méritos. A pesquisa de Faour é bem completa. E não vejo oportunismo nenhum. Por mais gorduroso que seja, é um bom livro que correlaciona as letras com a evolução da sociedade.

p.s. aguardem a resenha da bio do Milton.

30 de novembro de 2006 às 13:33  

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