29 de maio de 2009

Nei Lopes chuta o balde em CD de tom mordaz

Resenha de CD
Título: Chutando o Balde
Artista: Nei Lopes
Gravadora: Fina Flor
Cotação: * * *

No anúncio que propaga o lançamento do CD de inéditas de Nei Lopes, Chutando o Balde, nas lojas neste mês maio de 2009, a gravadora Fina Flor enfatiza o fato de o compositor ser autor de Gostoso Veneno, Goiabada Cascão e Tempo de Don Don. Os dois primeiros sambas são dos anos 70. O terceiro foi lançado por Zeca Pagodinho em 1988, ou seja, há mais de 20 anos. De lá para cá, Nei Lopes nunca parou de compor. Chutando o Balde prova com suas 16 inéditas autorais que a produção do compositor paira acima da média do gênero. Com parceiros como Ruy Quaresma (produtor e arranjador do disco), Cláudio Jorge, Luís Felipe de Lima e os integrantes do paulista Quinteto em Branco e Preto (Everson Pessoa, Magnu Sousá e Maurílio de Oliveira), Nei apresenta CD de tom mordaz, coerente com o título e a capa ilustrada por Mello Menezes. "Mas pra chutar / Tem que saber / Onde é que o balde vai bater / Pra coisa entrar / Sem ofender", admite na letra da faixa-título. Ainda assim, as ironias de suas letras nem sempre são finas. Pala pra Trás destila preconceito velado contra os gays no fim da letra que perfila o mané que usa o boné para trás. Pombajira Halloween ironiza a real valorização da cultura norte-americana no Brasil. Já Samba de Fundamento defende certo purismo no samba - retratado como seita que deve ser penetrada somente por iniciados em seus rituais - enquanto Dicionário se vale do significado original de palavras como axé, roqueiro e sertanejo para de forma indireta diminuir o valor de quem transita por outros ritmos musicais. A língua continua viva.

De toda forma, o disco soa mais interessante quando o compositor deixa de lado a crítica pura e simples para fazer crônicas do cotidiano à moda dos pagodes cariocas. Saracuruna-Seropédica, o maior destaque da safra de inéditas, relata com verve - entre o samba e a rumba - o caso de ovni surgido no trajeto que dá título ao samba. Ondina traça o perfil de baiana bissexual numa levada deliciosa. Outro trunfo, Oló também é uma delícia e pede registro de uma voz vigorosa, como a de Alcione, para obter força e brilho.

Letras à parte, Chutando o Balde é CD urdido com economia percussiva. Habilidoso dublê de cantor, o compositor se aventura por ritmos como samba-de-breque (Águia de Haia), samba de gafieira (Deusas e Devassas), partido alto (Confraria) e samba-enredo (Samba Emprestado). Não se trata do melhor disco de Nei Lopes. Ainda assim, Chutando o Balde expõe com propriedade os (rígidos!) valores que norteiam a obra coerente do compositor.

6 Comments:

Blogger Mauro Ferreira said...

No anúncio que propaga o lançamento do CD de inéditas de Nei Lopes, Chutando o Balde, nas lojas neste mês maio de 2009, a gravadora Fina Flor enfatiza o fato de o compositor ser autor de Gostoso Veneno, Goiabada Cascão e Tempo de Don Don. Os dois primeiros sambas são dos anos 70. O terceiro foi lançado por Zeca Pagodinho em 1988, ou seja, há mais de 20 anos. De lá para cá, Nei Lopes nunca parou de compor. Chutando o Balde prova com suas 16 inéditas autorais que a produção do compositor paira acima da média do gênero. Com parceiros como Ruy Quaresma (produtor e arranjador do disco), Cláudio Jorge, Luís Felipe de Lima e os integrantes do paulista Quinteto em Branco e Preto (Everson Pessoa, Magnu Sousá e Maurílio de Oliveira), Nei apresenta CD de tom mordaz, coerente com o título e a capa ilustrada por Mello Menezes. "Mas pra chutar / Tem que saber / Onde é que o balde vai bater / Pra coisa entrar / Sem ofender", admite na letra da faixa-título. Ainda assim, as ironias de suas letras nem sempre são finas. Pala pra Trás destila preconceito velado contra os gays no fim da letra que perfila o mané que usa o boné para trás. Pombajira Halloween ironiza a valorização da cultura norte-americana no Brasil. Samba de Fundamento defende certo purismo no samba - retratado como seita que deve ser penetrada somente por iniciados em seus rituais - enquanto Dicionário se vale do significado original de palavras como axé, roqueiro e sertanejo para de forma indireta diminuir o valor de quem transita por outros ritmos musicais. A língua continua viva.

De toda forma, o disco soa mais interessante quando o compositor deixa de lado a crítica pura e simples para fazer crônicas do cotidiano à moda dos pagodes cariocas. Saracuruna-Seropédica, o maior destaque da safra de inéditas, relata com verve - entre o samba e a rumba - o caso de ovni surgido no trajeto que dá título ao samba. Ondina traça o perfil de baiana bissexual numa levada deliciosa. Outro trunfo, Oló também é uma delícia e pede registro de uma voz vigorosa, como a de Alcione, para obter força e brilho.

Letras à parte, Chutando o Balde é CD urdido com economia percussiva. Habilidoso dublê de cantor, o compositor se aventura por ritmos como samba-de-breque (Águia de Haia), samba de gafieira (Deusas e Devassas), partido alto (Confraria) e samba-enredo (Samba Emprestado). Não se trata do melhor disco de Nei Lopes. Ainda assim, Chutando o Balde expõe com propriedade os (rígidos) valores que norteiam a obra coerente do compositor.

29 de maio de 2009 às 11:46  
Anonymous Anônimo said...

Eu conheço o Nei Lopes pessoalmente.É um cara maravilhoso,livre de preconceitos.Estranho ele mostrar de forma negativa os gays,mesmo de forma velada em seu CD.Preconceito seja ele qual for não é coisa boa.Principalmente no samba onde os negros são pioneiros e tão injustiçados.Viva a alegria do samba sem preconceito!

29 de maio de 2009 às 15:25  
Anonymous Anônimo said...

Não vejo preconceito em "Pala pra Trás". Vejo apenas como uma bricadeira, um sarro, como o gambá de "Tira-Gosto". A gente não deve levar tão a sério certas coisas, principalmente num disco que tem o título de "Chutando o Balde" e letras escritas por Nei Lopes, cara antenado, referência intelectual, sabidamente avesso a qualquer tipo de preconceito. O que achei estranho foi o Mauro, "fã de cantoras", não comentar nada sobre a voz maravilhosa da Sanny Alves (filha do Luiz Alves) que divide "Deusas e Devassas" com o Nei.

30 de maio de 2009 às 10:13  
Anonymous Anônimo said...

Mauro,

Uma pena foi a falta de resenha para o dvd do Nei que contou com o auxílio luxuoso do Quinteto, Ruy Quaresma e Nilze Carvalho. Abs,

Marcelo Barbosa - Brasília (DF)

Lembrando que Gostoso Veneno foi lançado por Alcione, no disco de mesmo nome, em 1979. Aliás a Marrom é a maior intérprete do compositor. E Beth Carvalho lançou Goiabada Cascão, em 1978, no histórico De Pé no Chão.

31 de maio de 2009 às 19:27  
Anonymous Anônimo said...

Não entendi: a Alcione vai estar no disco cantando Oló ?
A faixa título Chutando o balde, também está no novo disco da Alcione, que será lançado agora em junho.

1 de junho de 2009 às 08:12  
Blogger Ze da Silva said...

Ai, ai... ninguém aguenta mais os paladinos da moralidade e do bons costumes.

Imagino se Mário Lago e Lamartine fossem compositores hodiernos.
Não conseguiriam lançar uma música sem serem chamados de preconceituosos, racistas, machistas etc.

Pelo amor de Deus. Ironia, sarcasmo, brincadeira com as diferenças, tudo isso faz parte do mundo real.
Faz parte da música.

E, convenhamos, insinuar que o Nei é homofóbico só pode vir de quem não conhece o grande cantor/compositor.

Salve Nei!

8 de julho de 2009 às 22:56  

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