14 de outubro de 2009

Com verve, Alcina e Macalé encarnam Moreira

Resenha de Show
Título: Homenagem ao Malandro
Artista: Jards Macalé e Maria Alcina
(em fotos de Mauro Ferreira)
Local: Teatro Nelson Rodrigues (RJ)
Data: 13 de outubro de 2009
Cotação: * * * 1/2
Em cartaz até 15 de outubro de 2009, às 20h
Um dos pioneiros do samba de breque - gênero que ele alegava ter criado e do qual foi o principal difusor -, Antônio Moreira da Silva (1902 - 2000), vulgo Kid Morengueira, encarnou a figura do malandro com seu terno de linho branco e seu chapéu panamá. A reboque de seus breques, que quebravam os sambas com humor e teatralidade, Moreira da Silva construiu ao longo da longeva carreira uma personagem que passou até a se confundir com sua figura real. Intérpretes de universos distintos, mas ambos logo empurrados para as vias alternativas do mercado fonográfico, Jards Macalé e Maria Alcina reavivam, cada um a seu modo, o espírito de Morengueira em Homenagem ao Malandro, show econômico, ora em temporada no Rio de Janeiro (RJ) até quinta-feira - 15 de outubro de 2009 - após ter estreado em Curitiba (PR).
Cantora de esfuziante presença cênica, Alcina abre os trabalhos, dividindo o palco do Teatro Nelson Rodrigues com o violonista Sérgio Arara. Expansiva, Alcina realça o tom cinematográfico de O Último dos Mohicanos (Miguel Gustavo) em narrativa que atinge seu ápice momentos depois com Os Intocáveis, outra pérola de Miguel Gustavo (1922 - 1972), um dos principais fornecedores do repertório de Kid Morengueira. Neste tema, o clima é de um filme policial, à moda das tramas de 007. Os sons ouvidos nas bases pré-gravadas remetem ligeiramente ao universo tenso do hip hop, numa curiosa amostra da sintonia precursora da temática dos sambas de Moreira com a narrativa de alguns raps da atualidade. Explosiva, Alcina valoriza cada verso, com a mesma verve com que realça as espirituosas crônicas sociais esboçadas em Cachorro de Madame (Wilson Pires e Moreira da Silva) e em Faustina (Gadé). Infelizmente, ao fim de seu bloco, a cantora trai o conceito do show e revive sucessos marcantes de sua carreira. Apesar da tentativa vã de esboçar um paralelo entre Moreira e seus hits, apresentando Kid Cavaquinho (João Bosco e Aldir Blanc) como "o primo do Kid Morengueira", o show somente retoma seu curso e seu (feliz) sentido original com a entrada em cena de Jards Macalé.
Um discípulo confesso de Morengueira, Macalé encarna com mais sutilezas o espírito de Moreira. O artista já entra quebrando tudo com seu violão em Acertei no Milhar. Na sequência, simula com a boca até o som de um piston ao fim de um tema de Billy Blanco, Piston de Gafieira, incorporado ao repertório de Moreira. Macalé mostra intimidade com sambas como Olha o Padilha (Bruno Gomes, Ferreira Gomes e Moreira da Silva) e Na Subida do Morro (Ribeiro Cunha e Moreira da Silva), apesar de um branco na estreia carioca do show o ter feito esquecer alguns versos deste clássico do repertório de Kid Morengueira. Como Moreira, Macalé adora contar um causo em cena. E ele prende a atenção da platéia ao recordar em detalhes o lendário episódio de sua prisão, em Vitória (ES), em 1978, quando percorria o Brasil em turnê com Moreira pelo Projeto Pixinguinha. O episódio rendeu, inclusive, a primeira parceria de Macalé e Moreira, Tira os Óculos e Recolhe o Homem, apresentada na sequência. No fim, Macalé revive Amigo Urso (Henrique Gonçalves), pretexto para a volta de Alcina à cena para um dueto no número seguinte, Resposta do Amigo Urso. Contudo, no palco, a interação entre esses cantores de verves próprias não se realiza a contento. Nem mesmo no número do bis, Cachorro de Madame, em que Macalé simula os latidos do cão perfilado na letra cantada por Alcina. Ainda assim, Homenagem ao Malandro é show sedutor e tem seu mérito somente pelo fato de celebrar a figura de Moreira, uma nobre personagem do samba.

9 Comments:

Blogger Mauro Ferreira said...

Um dos pioneiros do samba de breque, um gênero que alegava ter criado e do qual foi o principal difusor, Antônio Moreira da Silva (1902 - 2000), vulgo Kid Morengueira, encarnou a figura do malandro com seu terno de linho branco e seu chapéu panamá. A reboque de seus breques, que quebravam os sambas com humor e teatralidade, Moreira da Silva construiu ao longo da longeva carreira uma personagem que passou até a se confundir com sua figura real. Intérpretes de universos distintos, mas ambos logo empurrados para as vias alternativas do mercado fonográfico, Jards Macalé e Maria Alcina reavivam, cada um a seu modo, o espírito de Morengueira em Homenagem ao Malandro, show econômico, ora em temporada no Rio de Janeiro (RJ) até quinta-feira, 15 de outubro de 2009, após ter estreado em Curitiba (PR).
Cantora de esfuziante presença cênica, Alcina abre os trabalhos, dividindo o palco do Teatro Nelson Rodrigues com o violonista Sérgio Arara. Expansiva, Alcina realça o tom cinematográfico de O Último dos Mohicanos (Miguel Gustavo) em narrativa que atinge seu ápice momentos depois com Os Intocáveis, outra pérola de Miguel Gustavo (1922 - 1972), um dos principais fornecedores do repertório de Morengueira. Neste tema, o clima é de um filme policial, à moda das tramas de 007. Os sons ouvidos nas bases pré-gravadas remetem ligeiramente ao universo tenso do hip hop, em curiosa amostra da sintonia precursora da temática dos sambas de Moreira com a narrativa de alguns raps da atualidade. Explosiva, Alcina valoriza cada verso, com a mesma verve com que realça as espirituosas crônicas sociais esboçadas em Cachorro de Madame (Wilson Pires e Moreira da Silva) e em Faustina (Gadé). Infelizmente, ao fim de seu bloco, a cantora trai o conceito do show e revive sucessos marcantes de sua carreira. Apesar da tentativa vã de esboçar um paralelo entre Moreira e seus hits, apresentando Kid Cavaquinho (João Bosco e Aldir Blanc) como "o primo do Kid Morengueira", o show somente retoma seu curso e seu (feliz) sentido original com a entrada em cena de Jards Macalé.
Um discípulo confesso de Morengueira, Macalé encarna com mais sutilezas o espírito de Moreira. O artista já entra quebrando tudo com seu violão em Acertei no Milhar. Na sequência, simula com a boca até o som de um piston ao fim de um tema de Billy Blanco, Piston de Gafieira, incorporado ao repertório de Moreira. Macalé mostra intimidade com sambas como Olha o Padilha (Bruno Gomes, Ferreira Gomes e Moreira da Silva) e Na Subida do Morro (Ribeiro Cunha e Moreira da Silva), apesar de um branco na estreia carioca do show o ter feito esquecer alguns versos deste clássico do repertório de Morengueira. Como Moreira, Macalé adora contar um causo em cena. E ele prende a atenção da platéia ao recordar em detalhes o lendário episódio de sua prisão, em Vitória (ES), em 1978, quando corria o Brasil em turnê com Moreira pelo Projeto Pixinguinha. O episódio rendeu, inclusive, a primeira parceria de Macalé e Moreira, Tira os Óculos e Recolhe o Homem, apresentada na sequência. No fim, Macalé revive Amigo Urso (Henrique Gonçalves), pretexto para a volta de Alcina à cena para um dueto no número seguinte, Resposta do Amigo Urso. Contudo, no palco, a interação entre esses cantores de verves próprias não se realiza a contento. Nem mesmo no número do bis, Cachorro de Madame, em que Macalé simula os latidos do cão perfilado na letra cantada por Alcina. Ainda assim, Homenagem ao Malandro é show sedutor e tem seu mérito somente pelo fato de celebrar a figura de Moreira, uma nobre personagem do samba.

14 de outubro de 2009 às 11:13  
Anonymous Anônimo said...

A Caixa deveria pagar melhor os artistas. Maria Alcina em violão e voz não dá. E mais: ela não tinha que colocar seus sucessos, afinal o show é temático. Todo show da Maria Alcina ela canta os mesmos sucessos. Achei tudo meio pobre demais, econômico. O show não é atraente. Faltou direção. Parece que a coisa corre solta, tudo no improviso. O Macalé merecia direção e acompanhamento digno de seu talento.

14 de outubro de 2009 às 11:14  
Anonymous Luc said...

Falta de ensaio: o problema habitual desses encontros musicais. Já vi até show sem roteiro nesse formato.

14 de outubro de 2009 às 12:32  
Anonymous Anônimo said...

Adorei o show.
Acho legal Alcina coocar sim aglguns sucessos, pois assim agrada a todos.

15 de outubro de 2009 às 01:40  
Anonymous Anônimo said...

Gostei muito do show.
Achei Alcina maravilhosa, Já Macalé apresentou o mesmo show de sempre, de voz e violão, mas ele é um ótimo artista e merece nosso respeito pela sua maravilhosa obra.

15 de outubro de 2009 às 01:42  
Anonymous Anônimo said...

Mauro, quem faz a direção do show?
Vc não colocou, é bom a gente saber. Todo show da Maria ela canta as mesmas coisas, os mesmos antigos sucessos. Se o foco é Moreira da Silva, foco na obra do sambista. O show é simples na instrumentação, mas poderia ser uma bela homenagem. Tudo muito bem construído, inclusive as falas.
Não gostei do show. Macalé e Maria não funcionaram juntos. Ficou estranho, duro. Quase saí antes de terminar. Não tem que agradar público com antigos sucessos em show específico de um autor. Quem vai sabe o que o espera. Mauro, sua crítica foi muito bem feita. Valeu.

15 de outubro de 2009 às 09:32  
Anonymous Anônimo said...

Fui ontem ao show e gostei muito, e pelo visto o publico tambem, pois foram muito aplaudidos.
Pelo que li e ouvi, pois fui ao camarim, o show nao teve direção. Eles foram convidados para homenagear Moreira e cada um escolheu uma parte do repertório, e nao tiveram muito tempo para ensaiarem os duetos pois moram em cidades diferentes.Alcina pouco se apresenta no RJ e muito se apresenta em SP, mas fico feliz de ve-la participando deste projeto e de um outro em homenagem ao Atalpho Alves.Mas concordo que em seus shows ela canta na maioria das vezes seus sucessos, o que acontece com muitos artistas que que não inovam no repertório talvez com medo de não agradar aos fans antigos, mas projeto é projeto e concordo com a critica.

15 de outubro de 2009 às 10:47  
Anonymous Anônimo said...

Assisti ao show e adorei, maravilhoso. Ao contrário do comentário de cima, achei que Jards e Alcina têm uma química perfeita no palco.
Dizer que Jards e Alcina NÃO FUNCIONARAM JUNTOS, e que QUASE SAIU ANTES DO SHOW TERMINAR, não parece o mesmo show que assisti; pois eles fazem blocos individuais e se encontram apenas na última música do show.Como assim? saiu antes de terminar, se só vimos os dois no palco juntos no final do show... hahahaha
Realmente, o amigo de cima não entende nada de Alcina e muito menos de Jards Macalé, que está perfeito nesta homenagem a Moreira da Silva.
Adorei!!!
Recomendo o show!

15 de outubro de 2009 às 11:40  
Anonymous Marília M said...

Moro em Curitiba e comecei a gostar de Moreira da Silva com meu pai, mas nunca pude assistir a nada dele ou sobre ele. Por isso, ao contrario de alguns comentários, achei o show ótimo, pois valorizou a obra do Moreira. Não sei se é uma questão de direção, mas me pareceu bem conduzido; as releituras de algumas das músicas foram modernas, atualíssimas, criativas. Nem de longe me pareceu um show de improviso; pelo contrário, não acho que se façam releituras deste nível sem pensar bem sobre elas. A Maria Alcina, responsável pela interpretação de boa parte delas, deu essa cara de modernidade. Além disso, tem ótima presença, e achei que o clima no palco era de entrosamento e de cumplicidade entres os dois artistas, que pareceram estar sentindo imenso prazer por poderem homenagear Moreira da Silva. Senti, no show, a presença de duas das coisas que, acho, constituem o que de mais importante existe na arte, enquanto manifestação cultural: a atemporalidade de algumas das coisas que diz e o legado da memória. E Macalé, brilhantemente, trouxe de volta o melhor do malandro, contando história, num resgate super importante.
Não entendo nada de orçamento de show e até acredito que a Caixa deva, sim, pagar melhor seus artistas, assim como outras empresas que investem em patrocínio, assim como também os governos deveriam pagar melhor os seus professores e seus policiais, assim como deveriam ser respeitadas as leis, como deveria haver moral e ética no Congresso, como um jogador de futebol não deveria ganhar tanto, enfim. Milhares de coisas poderiam ser melhores do que são, mas umas são piores do que outras. Estas, que são péssimas, eu questiono. Outras, como qualquer atividade que incentive a cultura e resgate a memória de um Brasil que faz arte bem além dos funks de moda e das cantoras baianas (nada contra, mas.), deve ser enaltecida e valorizada. Parabéns à Caixa, que, ao menos na minha cidade, segue investido em arte da melhor qualidade e que trouxe dois nomes importantes da nossa música homenageando um artista merecedor da homenagem.

16 de outubro de 2009 às 11:26  

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